Críticas


O PROFESSOR SUBSTITUTO

De: SÉBASTIEN MARNIER
Com: LAURENT LATIFFE, EMANUELLE BERCOT, LUÀNA BAJRAMI
25.07.2019
Por Luiz Fernando Gallego
A intenção de criar um clima insólito deixa pontas soltas nas atitudes dos personagens.

O título brasileiro desvia a atenção do espectador para um aspecto que acaba por não ser o que o enredo termina por destacar. Mas mesmo que fosse mantida a ideia do título original, “L’heure de la sortie”, o roteiro assinado pelo próprio diretor (em colaboração, e adaptando um romance francês lançado em 2002) enfoca na maior parte do tempo a difícil relação de um professor que, de fato, é um substituto (de outro que se matou na frente da turma) com seus alunos: bem estranhos, mas considerados muito acima da média pela direção do colégio em que a história se passa.

Desde “A Outra volta do parafuso”, de Henry James (Os Inocentes na versão cinematográfica de Jack Clayton em 1961) e do clássico de terror/sci-fi A Aldeia dos Amaldiçoados (1960) espraiou-se na ficção de terror o tema de crianças (ou adolescentes) que despertam, nos adultos que cuidam deles, suspeitas sinistras de que menores de idade podem estar escondendo alguma intenção bem maléfica contra os mais velhos. Na maior parte do tempo de O Professor Substituto um grupo de alunos têm comportamento esquivo, fazendo o gênero passivo-agressivo para com o novo mestre de modo geral - mas também chegando a verbalizar, explicitamente e de modo arrogante, o desagrado para com o professor.

Por seu lado, o substituto não encontra eco para suas preocupações crescentes em relação a estes jovens junto aos demais colegas - e muito menos junto à direção que se orgulha dos resultados excepcionais destes alunos nos testes. A intenção de criar um clima insólito dentro da banalidade cotidiana, entretanto, deixa pontas soltas nas atitudes dos personagens. Logo no início, os próprios alunos mencionam que recebem acompanhamento psicológico desde o suicídio do professor anterior, mas em nenhum momento o novo responsável pela turma leva a este psicólogo (que nunca aparece) seus temores. Nem comenta com os demais professores o que constata no comportamento bizarro e agressivo daquele grupo fora das salas de aula.

Em algum momento, alguém da direção diz ao professor que o que os alunos fazem fora dos limites do colégio não diz respeito ao colégio. Mas o professor testemunha várias atitudes de alto risco por parte destes alunos. Inicialmente, ele descobre coisas insólitas por mero acaso, passando a espionar o grupo intencionalmente - e até mesmo chega a interferir em uma das atitudes perigosas que eles tomam. Mas nem por isso se dirige aos pais ou mesmo às autoridades legais. Para o lado “realista” do filme, as opções do personagem soam bem insatisfatórias. E fica a impressão de que o roteiro está lançando um excesso de pistas falsas ao espectador, postergando o que seriam os temas principais. Pois ao mesmo tempo, telefonemas anônimos, luzes que piscam e se apagam, pesadelos do professor (e outras coisas bem esquisitas que lhe acontecem) parecem tentar aprofundar o clima de absurdo com certas alusões que podem ser intenções “kafkianas” do roteiro (já que o professor está tentando escrever uma tese sobre Kafka); ou seria para levantar suspeitas de uma paranoia do professor?

Mais não questionaremos sob o risco de spoiler do desfecho que parece algo imposto pelo roteiro, muito pouco claro se em relação a alguma iniciativa dos alunos... ou se se trata de algo acidental que aquele grupo de jovens temia.

Não conhecemos o romance original, mas pelo que se tem acesso na internet sobre o livro, o roteiro do filme teria modificado vários aspectos da obra literária que chegou a ser premiada como “primeiro romance”, mas que também recebeu críticas menos favoráveis.

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