Os críticos de Zhang Yimou preconizam que ele se tornou um escravo da forma, que, a exemplo de Carmen Miranda, voltou americanizado. Podem não estar errados, mas devem também levar em conta que a americanização de Carmen não tirou – e em grande medida realçou - o seu talento.
A Maldição da Flor Dourada – ou pelo menos a peça de Cao Yu em que se inspira - parte de um texto que remete a um drama shakespeariano. A ação se passa em 928DC, durante a dinastia Tang e envolve um casamento perverso entre um imperador cinematograficamente cruel (Chow Yun-fat) e uma esposa cinematograficamente bela (Gong Li). O casamento não é muito diferente de quase todos os outros no mundo: diariamente o imperador tenta envenenar a esposa e diariamente a esposa conspira contra seu marido. Shakespeare, no século 16, entendia melhor que ninguém os seus semelhantes. Cao Yu, cuja peça, de 1930, chama-se Tempestade, o último grande texto de Shakespeare, também não parece deixar que os seres humanos lhe passem desatentos.
Yimou trata operisticamente o texto que tem em mãos. Ressalta o drama, cria o coro e trabalha com subplots que, se por um lado confundem, por outro realçam a superfície de sua ação: a imperatriz está tendo um caso com o filho do primeiro casamento do Imperador. De novo, Shakespeare em estado bruto. Yimou faz o que desde Lanternas Vermelhas nunca deixou de fazer. Mergulha num universo de cores quentes e harmoniosas; esmera-se num desenho de produção radicalmente perfeccionista. E cria sequências de ação notavelmente coreografadas. A invasão do Palácio lembra os melhores momentos de O clã das adagas voadoras, o que não é pouco.
Poderia subir um pouco o tom. Seus filmes voltariam a ter a densidade dos primeiros trabalhos, mas é também possível que naquele momento todos tivessem idealizado um cineasta que jamais existiu. Há mais em Zhang Yimou, contudo, que um cineasta de grande habilidade vendido à estética dominante. Em A Maldição da Flor Dourada, talvez mais que na maioria de seus filmes, Yimou não está falando apenas de imperadores chineses, assim como Shakespeare de maneira alguma se voltava para príncipes da Dinamarca.
# A MALDIÇÃO DA FLOR DOURADA (Man cheng jin daí huang jin jia)
China, 2006
Direção e Roteiro: ZHANG YIMOU
Fotografia: XIAODING ZHAO
Montagem: LONG CHENG
Música: SHIGERU UMEBAYASHI
Elenco: CHOW YUN FAT, GONG LI.
Duração: 111 min.
