Críticas


PECADOS INOCENTES

De: TOM KALIN
Com: JULIANNE MOORE, STEPHEN DILLANE, EDDIE REDMAYNE.
17.04.2008
Por Luiz Fernando Gallego
BELOS E MALDITOS

Filmado a partir de livro baseado em fatos reais, Pecados Inocentes pode lembrar temas de romances e contos de F. Scott Fitzgerald – só que muito mais carregado nas tintas. De certa forma, a vida real que inspirou este filme imitou a arte: Fitzgerald pretendia, em Suave é a Noite, abordar uma relação escabrosa entre filho e mãe - embora tenha mudado este enredo para o de um relacionamento dificílimo entre filha e mãe. Mas também abandonou o que inicialmente seria uma importante intriga paralela à trama central do livro, bem diferente desta. Esta hesitação do romancista é responsável pela presença de uma personagem que tem um destaque nos primeiros capítulos sem que sua importância se mantenha ao longo da história narrada.



Savage Grace (título original) lembra os temas que Fitzgerald abandonou no último romance que concluiu. Outra asociação mais superficial é que o filme também mostra americanos itinerantes por uma Europa - que não é mais a da "Era do Jazz", mas a do pós-II Guerra, percorrendo um período que vai de 1946 a 1972.



O bem nascido Brooks Baekeland, neto do inventor da baquelite - e milionário por herança da fabricação pioneira de plásticos -, casou-se com Bárbara Daly, egressa de um extrato sócio-econômico bem inferior ao seu. A união duraria muitos anos - e chama a atenção que o casamento tenha durado o tempo que durou. O filho único do casal, Tony, será protagonista da tragédia que foi um dos maiores escândalos do jet set, já nos anos 1970.



O filme começa bem, com Julianne Moore dizendo a que veio em mais um desempenho tão irrepreensível quanto desafiador, bem acompanhada por Stephen Dillane como seu marido. Mas, infelizmente, à medida que os blocos de tempo vão avançando, as insuficiências do roteiro e dos diálogos afetados, vão se acentuando - enquanto a direção vai se revelando morna. Já a amoralidade na conduta dos personagens "esquenta" de modo inimaginável. Teria havido um cuidado excessivo (frieza) na apresentação da falta de limites que redunda em perversões familiares dignas de um enredo do nosso Nelson Rodrigues? Só que, neste caso, um enredo apropriado de fatos da vida real (embora se possa questionar como os autores do livro poderiam ter sabido sobre a intimidade promíscua dos protagonistas chegando ao ponto que é mostrado no filme).



Considerando a evolução que vemos, seja como realidade factual, seja como ficção, fica a impressão de que há uma aposta no sentido da psicologização “explicativa” para o desfecho trágico da história, quase como uma espécie de “Viu em que isso tudo pode acabar chegando?” - ou seja, um ar de acusação moral contra os desregramentos e transgressões bizarras que são vistas na tela.



No final das contas seria apenas para assistir Julianne Moore que se justifica, com enormes ressalvas, uma olhada no filme.



O TRECHO EM SEGUIDA NARRA EVENTOS DO ROTEIRO QUE NÃO SERIAM DE INTERESSE PARA QUEM PRETENDE CONHECÊ-LO E AINDA DESCONHECE OS FATOS REAIS QUE O INSPIRARAM



A atriz tem que enfrentar cenas de coito anal e de ménage à trois com seu filho, bi ou homossexual, e outro rapaz gay. E também de masturbar o filho e ter relação sexual incestuosa. Por fim, o matricídio (tema que do qual Fizgerald recuou em Suave é a Noite).



Cabe destacar que Moore é uma das atrizes que melhor sabe usar os figurinos destinados às personagens que vive (bastaria lembrar As Horas e Longe do Paraíso). Neste filme, as roupas que ela usa são por vezes um tanto óbvias nas cores, modelos e “significados”: serviriam para uma composição mais exteriorizada de outra intérprete menos dotada, mas Moore parece saber usá-las como uma segunda pele que se adere ao momento psicológico da personagem. Mesmo quem não tem tanta atenção para o vestuário de filmes, dificilmente esquecerá como a atriz soube utilizar (por vezes, criticamente) o vestido de baile dos anos ’40, o chapéu com roupas clássicas dos anos ’50 e tantos outros - até chegar ao conjunto vermelho da cena final. Pode ser que as roupas tenham sido feitas para chamar a atenção, mas o que se destaca é a propriedade da atriz se colocar dentro delas e utilizá-las como mais um dos enormes recursos de seu talento para compor a deterioração do relacionamento daquela mãe com seu filho.



O filme oferece pouco mais: a trilha musical se faz insistente, a fotografia (seria problema da cópia exibida no Festival do Rio 2007?) parecia “lavada”, esmaecida; e a mise en scène mais tímida e fria - quando o assunto chega a ferver. É estranho que no início haja um (gratuito ou com significado críptico) nu frontal de Stephen Dillane em um vestiário masculino – enquanto as cenas de transgressão e perversão sexual aparecem mais tarde um tanto insípidas, como se o diretor evitasse escandalizar "demais", acabando por enfraquecer o que é mostrado. Não é uma questão de cobrar algo na linha de cenas de “sexo explícito”, mas falta garra à direção. O desempenho, fundamental, de Eddie Redmayne se ressente um pouco desta falta de apoio – que Julianne Moore pode dispensar.



# PECADOS INOCENTES (SAVAGE GRACE)

EUA, Espanha, 2007

Direção: TOM KALIN

Roteiro: HOWARD A, RODMAN, baseado em livro de NATALIE ROBINS e STEVEN ARONSON

Fotografia: JUAN MIGUEL AZPIROZ

Figurinos: GABRIELA SALAVERRI

Edição: JOHN F. LYONS

Música: FERNANDO VELÁZQUEZ

Elenco: JULIANNE MOORE, STEPHEN DILLANE, EDDIE REDMAYNE.

Duração: 97 minutos

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