Gus Van Sant é um cineasta melhor do que muitos de seus filmes, frequentemente irregulares, embora quase sempre interessantes e capazes de incitar no espectador um olhar essencialmente cinematográfico, tal como o do diretor.
Paranoid Park é basicamente um filme "descritivo", praticamente centrado em ‘Alex’ (como também se chamava um dos garotos de Elefante, o melhor filme do diretor; nome que pode ser associado a idéia de “não-Lei” = A-Lex). A partir da sedução de participar de uma transgressão “menor” (pendurar-se em trem de carga), ou seja, uma travessura com algum grau de risco para si mesmo, ao reagir impulsivamente - em uma fração de segundo - contra quem tenta impedi-lo, o adolescente passa a viver um pesadelo acordado do qual vai querer se livrar de todas as formas.
A inconseqüência do pensamento-atos impulsivos dos jovens já foi exemplarmente mostrada em outro ótimo filme, aqui exibido em 2007, Alpha Dog, de Nick Cassavetes (já lançado em DVD no Brasil), no qual, em vez de apenas um, tínhamos um grande número de personagens que vivem a vida como em um jogo inconseqüente: tudo pode não dar em nada - ou então, qualquer coisa pode acabar em tragédia. A atitude de grande parcela da juventude retratada parece ser a de um escape pela indiferença do “tanto faz, tanto fez”: tudo parece tão ruim que seria melhor nem pensar.
Em Paranoid Park, Alex (com a inexpressividade sonambúlica do não-ator Gabe Nevins colocada a serviço do que Van Sant parece querer demonstrar) chega a dizer em algum momento que os problemas dele e de seus colegas da mesma faixa etária (pais separados em conflito, por exemplo) "não são nada perto da guerra do Iraque e da fome no mundo"... para pouco depois, declarar que não se interessa por ler jornal nem tal tipo de notícias: quando foi visto lendo um, estava procurando saber o que teria sido publicado sobre o incidente em que se envolvera na véspera.
A fuga de Alex em relação aos fatos que viveu se dá através da premissa não importa o que você fez, importa se foi descoberto – ou não. Aliás, um "princípio" (ou falta de) generalizado que se observa em vários níveis da sociedade: na política, nas negociatas, na corrupção dos poderosos que se transformou em regra geral.
O filme é a jornada da negativa, da dissimulação, da ocultação, não só dos atos cometidos.
Ou seja, também traz o espaço da ausência, da lacuna, do escape de si mesmo, da fuga à verdade - que, entretanto, Alex nunca vai deixar de saber qual foi. Nem mesmo a atração sexual tão forte nessa idade escapa do que ele tenta conscientemente recalcar. O sexo aparece como que sem gozo.
Fica em aberto a atitude de Alex: seria uma "reação defensiva" ao incidente que involuntariamente provocou ? Ou já existiria desde sempre, agora embutida em uma nova forma “blasé” de (não) estar no mundo?
O olhar de Van Sant mimetiza essa neutralidade indiferente, deixando o espectador em situação de perplexidade impotente - que parece ser a mesma perspectiva com que a juventude atual vê seu (nosso) tempo: a persepectiva de não ter perspectivas, ideais, utopias nem esperanças. Não se teme o susto de que as coisas possam melhorar...
# PARANOID PARK (PARANOID PARK)
Estados Unidos/França, 2007
Direção, Roteiro e Edição: GUS VAN SANT
Fotografia: CHRISTOPHER DOYLE e KATHY LI
Elenco: GABE NEVINS, DAN LIU, JAKE MILLER, TAYLOR MOMSEN.
Duração: 85 minutos
site oficial: www.paranoidpark.co.uk/