Desde First Cow, Kelly Reichardt demonstra uma arguta capacidade de empreender uma investigação sutil, e ainda assim aprofundada, das relações sociais e afetivas entre homens e do pacto de cumplicidade masculino. Em The Mastermind, essa interessante abordagem tem por ponto focal James Blaine (Josh O'Connor), carpinteiro e ex-estudante de arte que, nos anos 1970, decide arquitetar um ousado roubo a um museu, num dia comum de funcionamento da instituição e em plena luz do dia, para subtrair quatro obras de arte abstrata, que ele posteriormente vai repassar a um comprador misterioso. Blaine então se une a dois comparsas para colocar em prática a empreitada, que desmorona como um castelo de cartas à medida que o mentor, por orgulho ou falta de pensamento estratégico, se recusa a abortar os planos quando eles repetidamente se mostram inexequíveis. A partir desse fio condutor, a diretora desmonta com fino humor a estrutura clássica do filme de assalto, inclusive lançando mão de uma trilha sonora que brinca com os códigos deste subgênero – geralmente, pretensamente eletrizante e fundado em reviravoltas mirabolantes e soluções inesperadas. Na narrativa de Reichardt, ao contrário, a ruína de Blaine é explorada no que ela tem de mais patético, cinzelando um homem em crise, que teima em se ver como um sujeito pleno de boas intenções quando é apenas um pai de família negligente e ressentido com grave “síndrome de protagonista”. Aqui, é capital que Blaine seja de fato um protagonista morno, um homem que não desperta emoções fortes no espectador (nem ódio, muito menos admiração), que não consegue sequer se afirmar com anti-herói, características acentuadas pela comedida atuação de O'Connor. Neste contexto, o próprio título, The Mastermind, que poderia ser traduzido como “o mentor” ou “o mandante”, ganha maravilhosos contornos irônicos.
O desenvolvimento anda numa brilhante corda-bamba, entre a comédia de erros e o drama existencialista, tematizando o isolamento emocional do homem que escolhe dar corpo ao ideal clássico de masculinidade nas suas relações sociais e íntimas – e é sintomático que as mulheres sejam mantidas à força na periferia dessas relações e possam reagir apenas no espaço fora de quadro ou às sombras da madrugada. O plano final, que mostra uma descontraída confraternização entre policiais numa das pausas de uma repressão truculenta, serve para arrematar de forma bastante habilidosa o discurso do filme, que opta pelo refinamento e pela minúcia, quando poderia facilmente cair no panfleto. E, exatamente por isso, promove uma investigação abrangente e aguda, questionando não apenas o papel social do homem, mas a forma como o cinema reproduz a figura do herói de ação, ou (apenas muito recentemente) reflete sobre ela.