Críticas


DO OUTRO LADO

De: FATIH AKIN
Com: BALI DVARAK, TUNCEL KURTIZ, NURGÜL YESILÇAY, HANNA SCHYGULLA.
09.07.2008
Por Luiz Fernando Gallego
DESENCONTROS: TRIOS DE UM SEXTETO

Desencontros entre pais e filhos podem render melodramas mais ou menos banais, mas o risco é plenamente assumido em Do Outro Lado, cujo roteiro acabou recebendo vários prêmios internacionais, inclusive no Festival de Cannes’2007. Entretanto, reconhecer os méritos do enredo assinado pelo diretor Fatih Akin pode não fazer justiça à narrativa visual capaz de utilizar planos fechados sobre os rostos de seus atores e mudar, por exemplo, no enquadramento seguinte, para planos gerais – em edição tão delicada como firme, a serviço do momento em que a história está sendo desenvolvida. O melodrama está presente o tempo todo, mas a elegância dos enquadramentos que se distanciam dos personagens em passagens mais densas evita o efeito lacrimogêneo, podendo provocar no espectador mais reflexão do que mera comoção sobre os desacertos nos relacionamentos íntimos.



O pano de fundo é o de outro desacerto, mais amplo, entre povos, culturas e nações, abordando questões ligadas à estranheza alemã (e por extensão, ocidental) em relação a imigrantes turcos por lá radicados e a seus descendentes. Também é mencionada a questão da entrada da Turquia para a União Européia, embora o foco predominante do filme seja bem mais interpessoal e bem menos “político”. E não há só questões interculturais, em que nível for: divergências entre turcos, assim como entre alemães, também aparecem, sem estereotipia maniqueísta que definisse claramente “bons” e “maus”, de um lado ou “do outro” - ou ainda entre os lados.



Um recurso simples do filme é abrir os dois primeiros segmentos com letreiros que anunciam a morte de algum personagem. É assim que, sem ao menos colocar o título do filme, após um breve prólogo (que mostra uma cena aparentemente sem maior significado com o personagem Nejat, o único que terá algum tipo de ligação com todos os demais), pode-se ler “Morte de Yeter” – que o espectador nem sabe ainda quem é. Da mesma forma, um trecho seguinte será inaugurado com uma informação semelhante. Tal como são intitulados os capítulos de romances clássicos antecipando “como o personagem tal fez ou deixou de fazer isto ou aquilo”. Evidentemente, é criada tanto uma expectativa (sem fator surpresa) de “mortes anunciadas” - e de como as coisas vão evoluir até o desfecho previsto-, como fica estabelecido um certo “distanciamento” que se concretiza nos enquadramentos destes momentos-chave quando a câmera também se distancia para tomadas menos próximas e onde o esteticismo não fica gratuito, mas sintonizando forma e conteúdo.



Um filho, um pai, duas mães e duas filhas: este sexteto nunca se reúne completamente, havendo formação predominante de um trio na primeira parte e outras triangulações nos dois trechos seguintes, sendo que o último deles é, por fim, apresentado com o título original, Auf der anderen Seite. E que vai encerrar o filme com outro plano geral, longo e fixo mas sem nada a ver com o cacoete formalista da moda usado e abusado gratuitamente em filmes “de festivais” endeusados por cultos cinéfilos mais restritos.



As coincidências plantadas pelo roteiro acabam por parecer verossímeis pela habilidade de condução da narrativa, digamos, “literária” e também visual, com colaboração favorável dos atores, onde a geração mais velha ganha um certo destaque, como seria de se esperar da presença mais conhecida de Hanna Schygulla - de tantos filmes de Fassbinder, agora sessentona, mas sempre marcante e sem exageros nem derramamentos, mesmo nas cenas mais patéticas. Mas Nursel Köse como a prostituta e Turcel Kurtiz como o pai de ‘Nejat’ também são capazes de enorme empatia para com seus personagens. Patrycia Ziolowska encarna muito bem um papel intensamente apaixonado e ao mesmo tempo discretamente comovente. Estrela de filmes turcos, Nurgül Yesilçay enfrenta razoavelmente uma parte com menos nuances; e Bali Dvarak tem menos oportunidades como um personagem que fica quase que apenas “guia” e convergência, pois sua caracterização teria sofrido corte de uma trama paralela que alongava o filme para mais de duas horas. Mas não há do que nos queixarmos, por mais que o papel fique menos desenvolvido do que os demais: assim como a “ciranda” entre os seis se fecha através de ‘Nejat’, o filme faz um looping até a bela cena final, uma espécie de esperança e esforço no sentido da capacidade de perdoar.



# DO OUTRO LADO (AUF DER ANDEREN SEITE)

Alemanha, Turquia, Itália, 2007

Direção e Roteiro: FATIH AKIN

Fotografia: RAINER KLAUSMANN

Edição: ANDREW BIRD

Direção de Arte: SETH TURNER

Música: SHANTEL

Elenco: BALI DVARAK, TUNCEL KURTIZ, NURSEL KÖSE, NURGÜL YESILÇAY, PATRYCIA ZIOLOWSKA, HANNA SCHYGULLA.

Duração: 122 minutos

Site oficial: www.artificial-eye.com/edgeofheaven



Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário