(Texto revisto a partir da resenha que foi publicada neste site durante o Festival do Rio 2008, quando o filme foi exibido no Brasil pela primeira vez)
Grandes filmes já foram feitos a partir da situação de um personagem que inicialmente vivia isolado até que deixa alguém entrar em sua vida - e daí muita coisa se modifica, para melhor ou para pior, conforme o ponto de vista da dramaturgia ou do personagem. Joseph Losey mostrou esta situação mais de uma vez (O Criado, Cerimonia Secreta, etc) e Luchino Visconti construiu uma de suas obras-primas, Violência e Paixão, com tema análogo. Mas o mesmo ponto de partida pode dar origem a obras apenas medianas e às vezes piegas e/ou medíocres. Não chega a tanto, mas este segundo filme de Thomas McCarthy (o anterior foi o curioso O Agente da Estação, de 2003) repete aquele modelo de enredo, ficando bem distante dos resultados obtidos pelos cineastas lembrados acima; e escorrega várias vezes em situações-clichê de filmes americanos rotineiros. Mas não chega a ser descartável.
As intenções explícitas de O Visitante se remetem à situação dos imigrantes no território ianque após o 11 de Setembro, especialmente com relação àqueles de origem árabe - e para falar disto o caminho escolhido é o de fazer com que um desses, em situação de permanência ilegal, cruze o caminho de um homem fechado em seu próprio mundo depressivo/misantópico, provavelmente desde a morte da esposa. Ou desde sempre...?
Podem incomodar recursos enxovalhados de algumas passagens. Há uma cena fabricada para evidenciar de modo ostensivamente óbvio como este sujeito é indiferente aos demais e aos problemas dos outros: professor universitário, ele recebe em seu gabinete um aluno que pretende entregar, com atraso, um trabalho. Pretendia. Porque ‘Walter’ (Richard Jenkins) não dá a menor chance para que o rapaz detalhe os problemas pelos quais passou e pelos quais não teria preparado o trabalho no prazo devido. A cena é estereotipada, burocrática e nada sutil. Mas pior ainda é a necessidade de um “clima” sentimental na base de um ‘fogo de outono’ de envolvimento amoroso que parece pretender seduzir a platéia e ajudar a “passar a mensagem” social sobre os "ilegais" nos EUA.
Por outro lado, o filme consegue alguma fluência e mantém o interesse do espectador quando a história segue em frente, mesmo que com seus percalços: uma edição sensível na seqüência de várias cenas sugere que a linguagem cinematográfica está mais afiada do que o roteiro (assinado pelo próprio diretor). E o desempenho dos atores colabora bastante para transmitir o melhor da trama. Se Richard Jenkins parece, por vezes, mais esforçado do que talentoso, de um modo geral sua interpretação funciona, mesmo quando aprende a tocar percussão tão rapidamente: outro clichê do indivíduo que “vivia isolado do mundo”, mas que talvez tenha chances de ser "recuperável" por um caminho inabitual em relação a seus hábitos rígidos - e o ator se sai bastante bem em algumas passagens.
O casal jovem, formado por um sírio e uma negra africana, pode parecer “excessivamente simpático”, mas novamente os atores, tanto ele (Haaz Sleiman) como ela (Danai Gurira) mostram-se competentes. Hiam Abbass comparece com o talento ao qual vem acostumando os cinéfilos em filmes mais (Free Zone) ou menos (Lemon Tree) interessantes.
Um olhar um pouquinho mais reflexivo perceberá “as cordas dos marionetes” bem evidentes na construção dos personagens de modo algo esquemático, mas em seu terço médio e durante algum tempo da projeção o filme consegue “engrenar” e transmitir o que pretende de modo mais eficiente do que os recursos banais do roteiro.
# O VISITANTE (THE VISITOR)
EUA, 2007
Direção e Roteiro: TOM McCARTHY
Fotografia: OLIVER BOKELBERG
Edição: TOM McARDLE
Direção de Arte: LEN CLAYTON
Música original:JAN A. P. KACZMAREK
Elenco: RICHARD JENKINS, HIAM ABBASS, HAAZ SLEIMAN, DANAI GURIRA
Duração: 103 minutos
Site oficial: http://www.thevisitorfilm.com/
