Críticas


SINÉDOQUE NOVA IORQUE

De: CHARLIE KAUFMAN
Com: PHILIP SEYMOUR HOFFMAN, SAMANTHA MORTON, MICHELLE WILLIAMS, CATHERINE KEENER e outros
17.04.2009
Por Luiz Fernando Gallego
MAIOR O COQUEIRO, MAIOR É O TOMBO

Texto escrito durante o Festival do Rio 2008



A estréia na direção do badalado roteirista Charlie Kaufman mostra-se prestigiada pelo elenco de sonhos que reúne: destacam-se especialmente as participações de Philip Seymour Hofman, Samantha Morton, Diane Weist e Tom Noonan. Por outro lado, Emily Watson, Jennifer Jason Leigh - e em certa medida, além de uma fácil caricatura bem-humorada, Hope Davis - têm menos oportunidades do que mereceriam. Mas se o elenco excepcional pode seduzir o espectador, é bom advertir que tanto prestígio levou o roteirista e agora cineasta à desmesura que faz seu filme se transformar em uma enorme (e entediante) decepção de luxo.



As primeiras cenas fazem a platéia rir bastante com situações de total nonsense que lembram algo do humor existente no roteiro de Quero ser John Malkovich, evoluindo para um clima mais - digamos - “surrealista”. Surgem elipses enormes que levam a uma inicial confusão por conta de alguns anacronismos até que o espectador capte o tempo interno da ação acelerada e aos saltos. Mas, paradoxalmente, a partir daí o ritmo do filme vai ficando claudicante e com excesso de situações; algumas ainda divertidas, espertas e interessantes, mas a maioria delas mostradas de forma repetitiva, prolixa, perseverante e cansativa.



Uma citação insistente antecipa o que iremos ver: o personagem central está dirigindo para o palco uma nova versão de A Morte do Caixeiro Viajante, peça já clássica de Arthur Miller, sendo que em sua encenação os personagens idosos estão sendo vividos por atores bem mais jovens. A questão da temporalidade e da transitoriedade da vida está colocada: Caden Cotard (P. S. Hoffman) remonta o famoso texto sobre o fracasso do ‘sonho americano’ com sucesso - enquanto seu corpo dá sinais de doenças graves: sangramento nas fezes, na urina, pústulas no rosto, artrite, crises convulsivas, etc. Com tal tendência a apresentar sintomas físicos alarmantes – mas que desaparecem tão rapidamente como surgiram - é natural que ele tema que vá morrer em breve, e isto se expressa na idealização de um novo espetáculo com texto próprio (ou criação coletiva) que trata da consciência da finitude e sua negação cotidiana. Entretanto, este espetáculo ficará em ensaio e elaboração por décadas... sem que a morte lhe chegue. Antes disto, sua mulher (que é artista plástica) o deixa e sua vida emocional desanda mais ainda... e o filme também.



Kaufman parece estar com o ego inflado em grau extremo, ficando atraído pela tentação do descomedimento. Pleno de pretensão, parece querer falar de tudo e muito com ares pseudo-filosóficos e "profundidade". Mas a desmesura (a hybris dos gregos), tal como nas suas tragédias, será punida pelos deuses com a áte (cegueira da razão), uma forma de “dar corda” à ambição sem limites de se crer maior do que seu próprio métron. Ou seja, o sujeito ganha corda para acabar se enforcando por conta própria. Neste filme, o que era para ser “profundo” fica mais raso que um pires à medida que o humor arrefece e o enredo episódico perde as medidas - em todos os sentidos.



Este problema já era notável no terço final do roteiro supervalorizado – destrambelhado - de Adaptação. E mesmo o estimado Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças se perdia um pouco em repetições alongadas. Desta vez, entretanto, todos - e quase que só - os defeitos de Kaufman estão presentes e aparecem potencializados, fazendo com que seu filme narre uma história sinuosa e circunloquial sem tanta consistência, resvalando na obviedade. E é ele mesmo que, como diretor, sintoniza inteiramente com o que escreveu, sem a menor crítica.



# SINÉDOQUE, NOVA IORQUE (SYNECDOCHE, NEW YORK.)

EUA, 2008

Direção e Roteiro: CHARLIE KAUFMAN

Fotografia: FREDERICK ELMES

Edição: ROBERT FRAZEN

Direção de Arte: ADAM STOCKHAUSEN

Música: JON BRION

Elenco: PHILIP SEYMOUR HOFFMAN, SAMANTHA MORTON, MICHELLE WILLIAMS, CATHERINE KEENER, EMILY WATSON, DIANE WEIST, JENNIFER JASON LEIGH, HOPE DAVIS, TOM NOONAN

Duração: 124 minutos

Site oficial: http://www.sonyclassics.com/synecdocheny/



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