Críticas


007 – QUANTUM OF SOLACE

De: MARC FORSTER
Com: DANIEL CRAIG, OLGA KURYLENKO, MATHIEU AMALRIC, JUDI DENCH, GIANCARLO GIANNINI
12.11.2008
Por Luiz Fernando Gallego
A VINGANÇA CONSOLA?

A organização criminosa da vez é chamada de Quantum. E o filme ganhou distribuição internacional preservando, por exigência dos produtores, o título em inglês Quantum of Solace, aqui precedido do inevitável duplo-zero-sete para o publico não ter dúvidas de que se trata de mais um produto “garantido” pela marca “James Bond”. Mas será mesmo “mais um”?



Em um dos textos publicados neste site sobre o filme anterior da série, 007- Cassino Royale, o primeiro com Daniel Craig como o agente mais duradouro e menos secreto do cinema, pode-se ler (ver textos em “críticas”) que mudanças bem radicais desde que Bond é “Bond, James Bond”, talvez atendessem à famosa máxima eternizada em O Leopardo, de Visconti, segundo a qual as coisas precisam mudar para permanecer como sempre foram. Para que os filmes de 007 permanecessem interessando ao público atual, havia mesmo que fazer modificações. E mais mudanças aparecem neste novo filme da série.



Se as perseguições por terra, mar e ar mantêm a inverossimilhança eletrizante que pode até lembrar carreiras desabaladas de filmes de animação, temos - ao mesmo tempo - o clima mais dark de toda a série, compondo um misto de cartoon justaposto a alguma coisa do amargor desalentado dos policiais clássicos do gênero de “cinema noir”. E não é que funcionou?!



Por pouco o roteiro faz do “novo” Bond uma reciclagem do desencantado private eye Lew Archer dos romances de Ross MacDonald, levado à tela por duas vezes sem atingir o mesmo padrão quase “existencialista” dos livros - apesar da boa escolha de Paul Newman para o personagem, rebatizado (?) de Lew Harper nos filmes que existem em DVD no Brasil: Caçador de Aventuras e Piscina Mortal. Mas este novo (em todos os sentidos) Bond é mais sombrio, lembrando os livros originais de MacDonald, que por sua vez se inspiravam em clássicos de Raymond Chandler e Dashiel Hammett filmados com Humphrey Bogart. Faz sentido, pois afinal, os dias de hoje não estão mesmo para as gracinhas do antecessor de Daniel Craig, o almofadinha simpático que foi Pierce Brosnan no papel do agente autorizado para matar.



Por outro lado, em time que está ganhando, não se vai mexer demais. Especialmente os bem-sucedidos produtores como Barbara Broccoli, filha do homem que descobriu o filão dos textos de Ian Fleming para as telas, Alberto Broccoli. Os roteiristas (três) são os mesmo de Casino Royale: o badalado Paul Haggis (que escreveu Cartas de Iwo Jima para Clint Eastwood e dirigiu o oscarizado Crash-No Limite) e dois outros egressos da fase Pierce Brosnan; uma belíssima “bondgirl” está lá, com a pele morena e os sérios olhos de ressaca da ucraniana Olga Kurylenko; o vilão (segundo Hitchcock, quanto "melhor" o vilão, melhor o filme) é entregue a um ator competente como o onipresente francês Mathieu Amalric; "M" retorna em uma sexta carismática rodada de Dame Judi Dench, que pela segunda vez se mostra como uma chefona tão dura quanto maternalmente severa e preocupada com seu agente favorito - e perto da resolução final temos uma cena – como de costume – apocalíptica. Apesar de ser uma boa seqüência, o filme até aqui foi tão eletrizante o tempo todo, que esta, talvez pelo cenário desértico em volta, não chega a render tanto quanto pretendia. O epílogo elíptico, em breve cena de neve acaba sendo mais eficiente dramaticamente.



Ao mesmo tempo as mudanças se aprofundaram como nunca: não há Dry Martini nem quase gadgets, nem a frase surrada de apresentação, mas a fórmula de (muita) ação está preservada e até mesmo acentuada, inclusive com mais agilidade do que no filme anterior dirigido por Martin Campbell - que já orquestrara uma retomada mais tradicional do agente ao ganhar a cara de Pierce Brosnan (007 contra GoldenEye).



A batuta da vez foi parar nas mãos de Marc Forster, que quase sempre filmou um lado bem amargo da vida e de seus personagens: A Última Ceia (que deu Oscar a Hale Berry) se passava entre carrascos executores de penas de morte; Em Busca da Terra do Nunca mostrava a vida trágica do autor de Peter Pan; A Passagem abordava suicidas e premonições trágicas; Mais Estranho que a Ficção (talvez seu melhor filme) ameaçava de morte um personagem de livro ainda sendo escrito que não queria morrer; e O Caçador de Pipas, bem... era O Caçador de Pipas.



Aqui, mesmo que "inspirada" pelo terceiro Godfather, de Coppola (e certamente sendo algo originado do roteiro), destaca-se a filmagem que alterna a interação entre o herói e os vilões, todos em um grande teatro, com o que está acontecendo simultaneamente no enredo de uma ópera clássica encenada de forma contemporânea. O aproveitamento do clima criado pela música melodramática é um bom truque para acentuar a montagem paralela da ação no palco com aquela na “realidade” do enredo que se desenrola na platéia e nos bastidores. No caso, a música do final do primeiro ato da Tosca, de Puccini, é um recurso fácil, mas eficiente ao enfatizar o suspense, o clímax da descoberta da organização - e a violência, claro.



Mas até onde um diretor da “franquia” 007 poderia deixar uma suposta "marca autoral" quando os produtores são os verdadeiros donos da bola? Sobre este aspecto, ler o texto de Nelson Hoineff também para Casino Royale. Pode ser que os produtores tenham encontrado um diretor mais afinado com a amargura de Bond, que se apaixonara no filme anterior, foi traído e viu sua amada se deixar morrer.



Amargura, ma non troppo: para não perder o pique de Molto Presto, Prestissimo, o filme é bem mais breve do que o anterior (uma ótima opção), sendo o mais curto de toda a série. A edição é bem enxuta para manter a ação incessante, mesmo que alguns detalhes da trama fiquem sendo de apreensão não muito fácil. Mas certas partes não importam tanto quanto o todo que, apesar das cenas desenfreadas, fica marcado mesmo é pela busca de “um pouco de consolo” para o Bond mais soturno de todos - muito bem encarnado por Daniel Craig. “Um pouco de consolo” poderia ser uma opção de tradução para o título original – mas, provavelmente, não atrairia tanto o público masculino que agora, mais do que invejar os poderes de sedução e de agressividade (ainda maior do que no episódio anterior) de Bond/Craig, poderá até sentir um pouco de pena dele. Se o consolo advém da vingança ou não, só saberemos em 2010 para quando está prometido o lançamento do mais novo projeto, por enquanto apenas denominado “Bond, o 23º ”. Aguardemos.



# 007 – QUANTUM OF SOLACE (QUANTUM OF SOLACE)

EUA, 2008

Direção: MARC FORSTER

Roteiro: PAUL HAGGIS, NEAL PURVIS, ROBERT WADE.

Fotografia: ROBERTO SCHAEFER

Edição: MATT CHESSE, RICHARD PEARSON.

Desenho de Produção: DENNIS GASSNER

Direção de Arte: JAMES FOSTER, MARK HARRIS, PAUL INGLIS, CHRIS LOWE, MARCO RUBEO, IKE STALLION.

Música: DAVID ARNOLD

Efeitos Especiais MK12, MACHINE, CHROMAKEY-HITE.COM

Elenco: DANIEL CRAIG, OLGA KURYLENKO, MATHIEU AMALRIC, JUDI DENCH, GIANCARLO GIANNINI, GEMMA ARTERTON, JEFFREY WRIGHT

Duração: 106 minutos

Site oficial: www.007quantumofsolace.com.br

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