A carreira do cineasta argentino Carlos Sorin apresenta diversas particularidades em sua trajetória: o início é experimental, com um falso documentário, La Era Del Ñandú (1986), que é seguido por dois longas cômicos, entre eles Eversmile, New Jersey (1989), estrelado por Daniel Day-Lewis. Logo após essas incursões, ele estabelece seu cinema com Histórias Mínimas (2002), que recebe inúmeros prêmios em festivais, como San Sebastián e Havana. Nele, o realizador tece um drama minimalista apoiado em um elenco de não-atores em um cinema despretensioso que conquistou crítica e público. Ao formar seus alicerces estéticos, Sorin estabelece autoria nos projetos seguintes, O Cachorro (2004) e O Caminho de San Diego, com resultados entre o medíocre e o constrangedor. Se não é um bom filme, aliás como nenhum outro de sua filmografia, A Janela (2008) é, ao menos, um passo à frente em relação a seus últimos projetos.
A Janela é um filme sobre o tempo, tanto o presente quanto o passado. Para reforçar essa ideia, Sorin demarca toda a sua história com planos de relógios e o tilintar dos segundos passando para o escritor Antonio, que está preso a uma cama com a saúde débil, em uma evocação a Morangos Silvestres (1957), de Ingmar Bergman. É por intermédio de planos-detalhes de objetos do quarto que o diretor investiga aquele espaço mínimo por onde o senhor tem apenas uma fresta para o mundo através de uma janela. Esta, tanto em seu formato concreto quanto no sentido cinematográfico, abriga o espaço de desejos e memórias de Antonio: o início do filme apresenta um sonho dele, como uma projeção em 8 mm. E dentro da janela de exibição de sua mente passeiam reminiscências, neblina e rostos, que o confortam, como a menção a sua mãe e à estrela de cinema Greta Garbo.
O espaço-tempo de A Janela é estipulado, mas tudo daquele tempo presente remete ao passado em um universo fora de quadro que só pode ser esboçado superficialmente, mas nunca sentido e compartilhado pelo espectador. A essência motriz da trama é o reencontro de Antonio com seu filho, um renomado pianista que vive na Europa, após décadas de afastamento devido a rusgas e desentendimentos. E, mais uma vez, o tema em voga em uma produção argentina é a questão do conflito familiar, como no cinema de Daniel Burman (Ninho Vazio) e Juan José Campanella (O Filho da Noiva), mas que nunca transcendem os lugares-comuns típicos, e soam, em sua maioria, uns iguais aos outros.
Sorin aposta na brevidade do conto para narrar, então em cerca de 75 minutos tenta transcrever A Janela em um acerto de contas entre pai e filho, entretanto com poucos diálogos e cenas. A opção não é nem de longe negativa, pois ao não se escorar em clichês, o diretor reafirma a sua autoria na maneira de narrar. Mas é exatamente em sua mise-en-scène que vão residir os problemas do filme: não se desenvolve nenhuma relação especial entre os personagens e a paisagem, com planos curtos e que dão uma falsa impressão contemplativa; afinal, não se sente a passagem do tempo apenas com o som de um relógio em movimento. A questão estética também é prejudicada por uma cópia digital deficiente que não permite o efeito almejado do contato de Antonio com a imensidão do campo. Independente disso, Carlos Sorin não consegue dar vida a seus personagens por sua óbvia escolha de contenção, onde não há equilíbrio entre o distanciamento e o arrebatamento frustrado de um desfecho abrupto, ainda que esperado. O eufemismo da morte e a poesia das imagens e lembranças ficam apenas no papel do roteiro.
# A JANELA (La Ventana)
Argentina/Espanha, 2008.
Direção: CARLOS SORIN
Roteiro: CARLOS SORIN
Fotografia: JULIÁN APEZTEGUIA
Montagem: MOHAMED HAJID
Produção: JOSÉ MARIA MORALES
Elenco: ANTONIO LARRETA, ALBERTO LEDESMA, EMILSE ROLDÁN e ROBERTO ROVIRA
Duração: 75 minutos