Michael Jackson: This is It, documentário que registra os ensaios do show daquela que seria a derradeira turnê do artista, a curtain call, é o que se poderia chamar de imagem-síntese de um dos maiores astros pop que já habitaram esse planeta. O Michael Jackson que aparece ali é o puro produto de sua própria mitologia. Um gigante de forças consolidadas, para ficar numa bonita expressão do filósofo francês Gilles Deleuze, para quem a essência de uma coisa nunca aparece no princípio, e sim no meio, no curso do seu desenvolvimento, quando suas forças já estão consolidadas. Afinal de contas, o novo, em toda e qualquer vida, é também o acumulo de experiências, de fraturas, fissuras, vitórias e derrotas. Por isso, This is it traz uma imagem do MJ de sempre, aquele dos videoclipes, dos escândalos e dos noticiários. Mas também traz, como diz o subtítulo do show, um MJ like you’ve never seen before, um artista maduro, sério e perfeccionista. Depois de assistir ao filme, fica a sensação latente de perda de um clássico.
O documentário abre com uma cartela que dá conta daquilo que todo mundo mais ou menos já sabe: as imagens a seguir reunem os registros dos ensaios do show da turnê. Originalmente, elas foram feitas para o acervo privado do artista (o que quer que isso signifique!). Com a morte de Jackson, semanas antes do primeiro dos 50 shows marcados, a essas imagens se somaram outras, que trazem para a tela um festival de efeitos especiais, de animações digitais, imagens em 3D, luzes e fogos de artifício. Através de um competente e afinado trabalho de edição, This is It , o filme, monta o show que não aconteceu. Ou melhor: é tudo o que o show deveria ser, gostaria de ser e nunca chegaria a ser. Porque é cinema em estado puro, ilusão e fantasmagoria, Jacko no lugar onde efetivamente pertence e onde permanecerá eterno.
Mas justiça seja feita: é também montagem de fragmentos e associação de imagens que entregam, entre um passo e um agudo, um artista completo, afinado não apenas com sua obra, mas também com o trabalho dos músicos, da equipe técnica, dos bailarinos, dos coreógrafos, dos iluminadores, dos engenheiros de som e do diretor do espetáculo, Kenny Ortega (que também é o diretor do documentário). Quando os bastidores tomam o lugar da cena, o que permanece é o puro processo de lapidação, a maneira soberba e genial como Jackson administrava a construção do mito no inacreditável corpo franzino do homem. Não deixa de ser comovente vê-lo articular movimentos corporais e ritmos, paradas e pausas musicais, ruídos e trinados. Tudo com um único objetivo: levar seu público a experimentar sensações que nunca haviam sentido antes. E não é isso, também, o que faz o cinema?
O texto da abertura informa que o documentário é um registro do “presente apaixonado” que Jackson preparava para os fãs. Expressão de duplo sentido, que chega mesmo a doer quando se constata que a imagem na tela também entrega um astro em pleno “presente apaixonado”, mostrando uma coerente, justa e honesta sintonia com o trabalho árduo de uma carreira inteira.
MICHAEL JACKSON’S: THIS IS IT
EUA, 2009
Direção: KENNY ORTEGA
Trilha sonora:MICHAEL JACKSON
Fotografia: KEVIN MAZUR
Produção:CRAIG CONOLLY
Duração:112 minutos