Críticas


ABRAÇOS PARTIDOS

De: PEDRO ALMODÓVAR
Com: PENÉLOPE CRUZ, LLUÍS HOMAR, BLANCA PORTILLO
06.12.2009
Por Luiz Fernando Gallego
REPETIÇÕES E AUTOINDULGÊNCIA

Este texto foi escrito quando o filme foi exibido no Festival do Rio 2009



As referências cinematográficas abundam no mais recente filme de Pedro

Almodóvar: o “nome de guerra” de uma “bela da tarde” seria ‘Severina’

(como a do filme de Buñuel); a ‘Lena’ vivida por Penélope Cruz faz uma

sessão de fotos com cabelo, maquiagem e expressões faciais que

mimetizam Audrey Hepburn na época de Sabrina ou de

Bonequinha de Luxo e Infâmia; como em outros filmes de

Almodóvar, há alusão aos melodramas de Douglas Sirk, sendo que

Viagem à Itália, de Rossellini, é citado explicitamente. O

cinéfilo atento e aplicado pode encontrar muito mais referências,

embora a recriação mais feliz (e nem tão óbvia) seja de uma pintura de

Magritte em que os amantes se beijam com os rostos cobertos por panos

(aqui, lençóis). (No filme de Agnès Varda, As Praias de Agnès,

que também foi visto no Festival do Rio 2009, a diretora “encenou” o

mesmo quadro: de início tal e qual na tela original, mas logo

mostrando, abaixo dos rostos velados, os corpos despidos, sem lençol,

com direito à exposição de um pênis ereto. Varda está ousando aos 80

anos e Almodóvar, menos, aos 60 ?)



Uma resenha da crítica estrangeira na época em que este filme foi

exibido em Cannes (sem nenhuma premiação) denunciou que quem esperava

encontrar carne e sangue em Abraços Partidos, encontrará apenas

celulóide – o que não deixa de ser uma senhora decepção em comparação

ao que Almodóvar nos acostumou. Mas, infelizmente, mesmo que o

cineasta tenha querido mudar de tom, o resultado final é um tanto

anêmico.



O personagem central é um roteirista madurão que usa pseudônimo (como

a escritora de A Flor de meu Segredo). Tendo ficado cego, faz

contraponto à possibilidade de outros conseguirem fazer leitura labial

para filmagens sem som. Este recurso é utilizado pelo produtor de um

filme-dentro-do-filme que quer saber o que sua amante (‘Lena’) fala

sobre ele nos intervalos das tomadas. Ele usa seu filho para um

suposto making of que, de fato, é uma forma de espionagem; e recorre a

uma especialista em leitura labial que, quando é mostrada, faz a

platéia rir. Também pode ser muito engraçada a sinopse de um roteiro

com vampiros em bancos de sangue, sinopse apenas falada por um

ajudante do roteirista cego, aliás, uma digressão sem inserção no

enredo. Fala-se muito em filmes de Almodóvar - que geralmente

apresentam requinte visual na narrativa. Aqui, o recurso à informação

verbal pesa bem mais. E pesa.



Assim também a repetição do recurso de apresentar sua história em

flashbacks, com idas e vindas no tempo. Essa estrutura formal

funcionava à perfeição no roteiro de Fale com Ela, e menos

satisfatoriamente em Má Educação. Desta vez, parece estar se

tornando um hábito vicioso de Almodóvar: não há um equilíbrio

harmônico entre as cenas cômicas e as dramáticas - e nem mesmo as

“revelações” (como havia em Volver e em outros filmes do autor)

representam reviravoltas tão impactantes. Mesmo o que parecia um recuo

do tema da pedofilia para o gênero “noir” em Má Educação era

mais satisfatório e mais ousado do que acontece em Abraços

Partidos
.



O risco de que Bergman se auto-acusou (fazer “filmes de Bergman”) e no

qual Fellini caiu (fazendo “filmes de Fellini”) parece estar ameaçando

o mais famoso cineasta espanhol da atualidade: repetição das mesmas

estruturas formais de roteiro, com ou sem pertinência em relação ao

tema e à história que se quer narrar, além de excesso de citações e

auto-citações, denunciando uma certa autoindulgência com um momento

menos inspirado.



# ABRAÇOS PARTIDOS (Abrazos Rotos)

Espanha, 2009

Direção e Roteiro: PEDRO ALMODÓVAR

Fotografia: RODRIGO PRIETO

Edição: José Salcedo

Música: Alberto Iglesias

Elenco: Penélope Cruz , Lluís Homar , Blanca Portillo , José Luis Gómez , Tamar Novas

Duração: 128 minutos

Site oficial: http://www.losabrazosrotos.com/

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