O Mensageiro é a estreia na direção de Oren Moverman, o co-roteirista de Não estou Lá (I’m not there, de Todd Haynes) e o filme vem chamando a atenção sobretudo pelo desempenho de Woody Harrelson, presente em várias listas de candidatos aos prêmios da temporada - incluindo a indicação para Oscar de ator coadjuvante. O roteiro de Moverman também está na corrida do Oscar, mas não é necessariamente melhor do que o seu tema; assim como a participação de Harrelson não faz sombra à excelente composição de Ben Foster, que vem sendo injustamente esquecido nas premiações: na verdade, a dupla “faz o filme” em um dueto de interpretações antológico e com entrosamento exemplar.
Seus personagens são militares com base em New Jersey encarregados de participar ao “familiar mais próximo” a morte de um combatente no Iraque. Eles precisam chegar às casas dos parentes antes das mortes serem divulgadas pela internet ou TVs a cabo: sua missão é considerada de prioridade absoluta e até mesmo é chamada de “sagrada”. No papel de portadores de tão más notícias seguem um protocolo de frases burocráticas, e precisam considerar que suas atitudes devem ser totalmente não-pessoais, pois seriam apenas representantes oficiais (e usando as melhores fardas) do Ministro da Defesa norteamericano. Falam “em nome do Governo”, e - como é informado ao mais novo na missão - “você não é Deus”: eles não estão ali para confortar ninguém nem podem ao menos tocar (fisicamente) em nenhum “PMP” (parente mais próximo).
De alguma forma, a orientação de como devem fazer o que têm de fazer lembra bastante o modo pelo qual George Clooney leva adiante seu trabalho no filme Up in the Air (rebatizado como Amor sem escalas no imbecil título brasileiro). A grande diferença é que o personagem de Clooney no outro filme está pouco se lixando para aqueles que estão perdendo o emprego e cuja comunicação lhe cabe quase prazerosamente.
Já em The Messenger (título original), o mais jovem sargento Montgomery (Foster) recebe sua tarefa com absoluto constrangimento, tentando manter-se dentro das especificações, mas sem a menor convicção de que fazem o que fazem como deveriam fazer. E como é que se deve comunicar uma perda por morte a um pai, a uma mãe, a uma esposa, a um filho ainda criança?
O que o filme tem de melhor não é responder a essa pergunta (nem esta é sua intenção), mas mostrar como as guerras se perpetuam dentro dos sobreviventes mesmo depois de retirados da frente combate, ainda que por ferimento em ação heróica - como é o caso do sargento vivido por Bem Foster. Ele é definido pelo colega mais velho (Harrelson) como “mais um menino perdido”, ou seja, um desses rapazes que entram para um instituição como o exército como que em busca de uma família que não tem ou nunca tiveram.
Montgomery tinha uma namorada que agora está para se casar com outro homem, embora o receba de volta do Iraque nas primeiras cenas do filme com flores (ele diz que ainda não morreu para receber o buquê) - e sexo. É previsível que ele vá acabar se envolvendo mais do que “deveria” em uma de suas missões “sagradas”. É neste ponto que entra em cena Samantha Morton, sempre lembrada como a personagem muda de Poucas e Boas, de Woody Allen, ao lado de Sean Penn. A atriz surge bem mais gorda, com um físico adequando à sua personagem, uma dona de casa bem simples.
O filme lembra um pouco Jardins de Pedra que Coppola realizou em 1987 sobre os funerais dos soldados mortos na Guerra do Vietnam, mas enquanto o filme de Coppola, embora correto, não deixou lembrança mais forte, O Mensageiro, sem descambar para a pieguice ou sentimentalismo, mostra-se com mais pathos dramático, sendo mais bem-sucedido nos breves episódios de comunicações de mortes (com uma participação pequena, mas marcante, de Steve Buscemi em um desses momentos). Menos satisfatória é a evolução da relação de Montgomery com a festa de casamento de sua ex-namorada; e mesmo o que o enredo destina a Samantha Morton não é particularmente inspirado, ainda que seja mantida uma dignidade bem verossímil para as situações desenvolvidas sem maiores ênfases. Fica a impressão de que os roteiristas precisaram “preencher” o filme além da situação básica dos “mensageiros de mortes ocorridas”, mas deve-se louvar a seriedade com que o tema foi abordado.
Cabe ressaltar que a direção de Moverman não é nada preguiçosa, esforçando-se em planos de duração mais longa, privilegiando a continuidade nos desempenhos dos ótimos atores que conseguiu para sua estréia como diretor. O ritmo parece intencionalmente pausado e ainda que haja uma certa lentidão em alguns trechos e o lance da festa pudesse ser omitido, o resultado final é bem merecedor de consideração.
Quanto ao desempenho de Woody Harrelson: embora o ator não tenha considerado nada boa sua participação em O Acompanhante, de 2007, dirigido por Paul Schrader, esta foi uma de suas melhores interpretações, vivendo um tipo bastante diferente de sua "persona" e papéis habituais. Mas este filme foi pouco visto, tendo sido lançado no Brasil apenas em DVD depois de exibido no Festival do Rio do mesmo ano. Mais do que em O Mensageiro, seria em The Walker (título original de Acompanhante) que o ator se supera e surpreende. No novo filme ele está ótimo e sem alguns exageros habituais, mas como (quase) sempre; quem chama mais a atenção - até pelo tom mais low profile - é mesmo Ben Foster.
# O MENSAGEIRO (THE MESSENGER)
EUA, 2009
Direção: OREN MOVERMAN
Roteiro: OREN M OVERMAN e ALESSANDRO CAMON
Fotografia: BOBBY BUKOWSKI
Edição: ALEXANDER HALL
Direção de Arte: SCOTT ANDERSON
Música: NATHAN LARSON
Elenco: BEN FOSTER, WOODY HARRELSON, SAMANTHA MORTON, JENA MALONE, STEVE BUSCEMI
Duração: 112 minutos
Site oficial: http://www.themessengermovie.com/