Ainda durante os créditos de A Árvore vemos um caminhão transportando uma casa inteira através de estradas do interior da Austrália. Esta imagem, em belas tomadas, ficará ainda mais forte retrospectivamente, quando um dos temas centrais do filme passar a ser a imobilidade da família do motorista da mudança depois de sua morte. Deixar a própria casa construída ao lado de uma enorme árvore e/ou derrubar esta árvore: resoluções difíceis de serem tomadas.
Julie Bertuccelli, a diretora de A Árvore, volta a lidar com o tema da perda que também se fazia presente em sua realização anterior, Desde que Otar partiu (2003). Desta vez, é a personagem vivida por Charlotte Gainsbourg e seus quatro filhos menores (um rapazinho adolescente e mais três crianças) que vão ter que enfrentar uma morte na família. O retrato inicial é bastante realista, exibindo uma dramaturgia de base pouco “dramatizada” e sem ir além do drama que já envolve em si mesma a situação de luto. Essa abordagem pode lembrar um pouco o livro (Prêmio Pulitzer 1958) de James Agee, A Death in the Family (1955), filmado várias vezes como All the Way Home, certamente pela oportunidade que oferecia a atrizes como Joanne Woodward, Jean Simmons ou Sally Field.
O filme de Bertuccelli também é inspirado em um romance cujo título original poderíamos traduzir como Pai Nosso que estás na Árvore, (2002), da também atriz (bissexta ou ex-atriz) Judy Pascoe. O nome do livro se refere à fantasia da única menina entre os filhos e que com seus 8 anos está certa de que o espírito de seu pai ficou na enorme figueira do terreno onde moram - e junto à qual seu pai, ainda bem moço, morreu.
Esta menina pode até soar um pouco irritante em sua obstinação, mas o que presenciamos é uma forma plausível para uma criança tentar elaborar perdas significativas, valendo ressaltar a que essa garota e toda a família passaram a vivenciar: o caçulinha não fala, outro menino cortou o cabelo, o adolescente mais velho tenta ser racional, em confronto com a mãe (personagem da Gaisnbourg) que se mostra totalmente desamaparada, depressiva, certamente acentuando as limitações que já tinha quando o marido estava vivo.
Inicialmente lento e des-dramatizado, A Árvore vai despertando interesse crescente à medida em que discretos eventos, bastante plausíveis para aquelas vidas naquela localidade, vão ganhando forma no roteiro. Sem exagero melodramático algum, o filme ganha o status de uma “vida como ela – de fato – é” - ou como pode ser. A irritação “edípica” da menina com algum possível novo namorado da mãe e a incapacidade desta mãe em lidar com as sutilezas de sua nova situação (e a de seus filhos) ganham forte verossimilhança em uma narrativa pausada sem ser tediosa - e que pode até mesmo surpreender quando fatores ligados a uma natureza inclemente surgem como que para resolver o que as pessoas não conseguiram decidir até agora. A necessidade (ananké), mais do que a maturidade, é que vai impor a continuidade da vida que precisa prosseguir a despeito das perdas mais doloridas. Um belo filme no seu todo.
# A ÁRVORE (L’ARBRE.)
Austrália/França, 2010
Direção: JULIE BERTUCCELLI
Roteiro: JULIE BERTUCCELLI baseado em roteiro original de ELIZABETH J. MARS
Edição: FRANÇOIS DÉGIDIER
Música: GRÉGOIRE HETZEL
Elenco: CHARLOTTE GAINSBOURG, MORGANA DAVIES, MARTON CSOKAS, CHISTIAN BYER
Duração: 100 minutos
Site oficial: http://www.larbre-lefilm.com