Texto revisto a partir do que foi publicado durante o Festival do Rio 2010
Ao longo dos anos 1960, quando alguns filmes de diretores menos inspirados tentavam imitar as obras de Michelangelo Antonioni sobre a incomunicabilidade ou o tédio de uma elite existencial e socialmente aprisionada em seu próprio umbigo e sem perspectivas, algum crítico escreveu que “filmes sobre o tédio não precisam ser entediantes”.
Sofia Coppola precisava aprender essa lição.
Somewhere (título original), incrivelmente premiado com o Leão de Ouro do Festival de Veneza 2010, pretende demonstrar de modo pleonástico a vida “vazia” de um astro de cinema (papel que coube a Stephen Dorff) . Para isso, carrega a mão nos “tempos mortos” que Antonioni inaugurou há meio século. As tomadas longas de cenas esticadas sublinham o pouco que Sofia tem a dizer de modo exaustivo (e exaurido) sobre o assunto. As cenas podem até mesmo ser repetitivas como no caso das dançarinas gêmeas que fazem “pole dance” particular para o ator com seu tédio agravado por estar preso a um quarto de hotel devido a um braço engessado.
O sucesso profissional deste sujeito implica em um dia-a-dia de compromissos definidos pela agenda de sua assessora, sendo ele não mais do que uma espécie de resultado – ou “produto” - de uma programação que escapa ao que seria sua iniciativa - que, aparentemente, é nenhuma: a tudo se submete sem demonstrar interesse - ou desinteresse. Parece um “produto” robotizado. Para deixar isso bem claro, muito claro, didaticamente claro, Sofia Coppola encena tudo de forma que o filme vai ficando tão robotizada quanto.
O que esse sujeito deseja, além de contratar gêmeas para assistir “pole dance” particular no quarto de hotel onde está morando, o famoso “Chateau Marmont” de Los Angeles? Sexo casual, claro, não faltando quem se ofereça para ele ou quem ele conquiste sem nenhum esforço: afinal é jovial, tem boa aparência e, acima de tudo, é famoso. Festinhas? Não parecem interessá-lo. Ler, ver filmes... nem pensar...
O único elemento que “fere” essa rotina alienada e alienante é a presença eventual de sua filha de onze anos que reside com a mãe. Uma súbita necessidade da mãe “dar um tempo” (para que? em quem? na filha?) faz com que ele precise estar com a menina-moça por alguns dias, mais do que em um comum “fim-de-semana com o pai”. E apenas pelos dias antes da garota começar uma colônia de férias.
Sem nenhuma criatividade ou mínima contribuição nova para o tema da “vida vazia" de um "famoso", assunto evidente nos primeiros dez ou quinze minutos de filme e que se esgota logo em seguida, Sofia Coppola estica as cenas, a ponto de quase se poder pensar que o faz para atingir a metragem habitual de hora e quarenta de projeção. Não dá para acreditar que ela acredite que esteja desenvolvendo alguma coisa sobre esta versão masculina de sua Maria Antonieta igualmente aprisionado em uma rotina de tédio e de “far niente” nem tão “dolce” assim.
Tal como no raso roteiro, apenas a participação de Elle Fanning como a filha do astro fere o tédio que é o próprio filme e sustenta algum interesse nesse mar de previsibilidade e pretensão que resulta em uma obra tão ou mais vazia do que o que pretende retratar.
# UM LUGAR QUALQUER (SOMEWHERE)
EUA, 2010
Direção e Roteiro: SOFIA COPOLLA
Fotografia: HARRIS SAVIDES
Edição: SARAH FLACK
Música: PHOENIX
Elenco: STEPHEN DORFF, ELLE FANNING, CHRIS PONTIUS, NATHALIE FAY
Duração: 97 minutos
Site oficial: http://www.scsomewhere.com/