Hoje em dia, nenhum Fausto precisa vender a alma ao diabo. Nem o diabo precisa comprar almas já inclinadas a tanto sexo, drogas, rock, drogas, internet, drogas, cultura do narcisismo, fama e sucesso (e drogas de todos os tipos -´Big Brother´, incluído), além de todos os caminhos que não levam à Roma nem à santidade.
Pelo contrário: o personagem central de Sem limite, interpretado pelo bonitão Bradley Cooper (conhecido por aqui pela chanchada Se beber, não case), ‘Eddie Morra’, é um fracassado escritor (que não escreve uma linha) e que foi abandonado pela mulher que amava. O ex-cunhado picareta (sempre os cunhados picaretas...), entretanto, funciona como um involuntário sub-Mefistófeles pós-pós-moderno ao oferecer ao ex-marido de sua irmã uma droga ainda não lançada no mercado (das drogas). O tal ‘NZT’ é uma pílula prateada meio transparente (aparência, afinal, é tudo) que potencializa todos os talentos e habilidades latentes em quem usar tal maravilha curativa de nossas inibições, bloqueios, sintomas e angústias. E ainda faz muito mais. Quem não vai querer mais da mesma?
O filme dirigido por Neil Burger (do manipulador e bobinho O Ilusionista, com Edward Norton) não quer ser uma nova versão de Fausto de Goethe, longe disso! Nem chega a ser o verdadeiro Mefistófeles um personagem mais episódico vivido por Robert De Niro (em mais um desempenho dispensável nesta sua fase de “regressão artística” – como diz o colega da crítica carioca João Marcelo).
Para dar uma idéia sobre o que é este filme poderíamos dizer que chega às raias do trash em uma cena de porradaria perto do final quando ‘Eddie’ precisa de mais uma dose da tal substância – e de qualquer jeito - mas a última pílula disponível no momento acabou de ser usada por um brutamontes que quer vê-lo em pedacinhos. O recurso usado para conseguir o princípio ativo é igualmente dispensável em seus exageros. Afinal, o título promete a verdade, nada mais do que a verdade: tudo é exagerado e sem limite. Se fosse para falar sério, falaríamos da hybris, desmesura, descomedimento: a falha trágica dos gregos e suas tragédias. Mas o buraco do filme é bem mais embaixo, jamais acima. Por exemplo, a estrutura do roteiro é já demais manjada: aquela coisa de começar em um momento-chave de tensão e suspense para um longo flashback explicativo de como as coisas chegaram àquele ponto que é retomado dali para frente, já perto do desfecho da história.
E antes do momento em que a coisa perde um pouco o pé, vamos combinar que o ator protagonista (de quem Sem limite depende muito) está bastante bem para o gasto - e que os efeitos especiais caprichados desta vez servem bem ao que a tal droga pode produzir. E que o filme se deixa assistir, mantendo o interesse do espectador que não esperar mais do que se pretendeu. É aquele tipo de filme que nem enche os olhos, na verdade entra por um olho e sai pelo outro - mas cumpre a função de passar o tempo de quem não tem mais nada melhor para fazer. E não há mensagem “moralista” alguma para fingir hipocritamente que a coisa é séria.
# SEM LIMITES (LIMITLESS)
País, 2011
Direção: NEIL BURGER
Roteiro: LESLIE DIXON, baseado no livro de Alan Glynn
Elenco: BRADLEY COOPER, ROBERT DE NIRO, ABBIE CORNISH, JOHNNY WHITWORTH, ANDREW HOWARTH
Fotografia: JO WILLENS
Edição: TRACY ADMANS, NAOMI GERAGHTY
Música: PAUL LEONARD-MORGAN, NICO MUHLYElenco:
Duração: 105 minutos
Site oficial: http://www.iamrogue.com/limitless