Críticas


180º

De: EDUARDO VAISMAN
Com: MALU GALLI, EDUARDO MOSCOVIS, FELIPE ABIB
22.09.2011
Por Daniel Schenker
ATORES DOMINAM A TELA

Há um evidente descompasso entre a qualidade do trabalho dos atores e a fragilidade do texto em 180º , de Eduardo Vaisman. Eduardo Moscovis, Malu Galli e Felipe Abib não medem esforços para emprestar credibilidade a, respectivamente, Russell, Anna e Bernardo. Trazem para o filme a experiência acumulada no teatro e atingem a ambicionada verdade interpretativa. Entretanto, não encontram amparo no roteiro (de Claudia Mattos), que se torna especialmente insatisfatório no desfecho.



O cineasta procura entrelaçar o registro de elos passionais com um dilema ético. Anna foi namorada de Russell antes de se envolver com Bernardo. Mesmo na nova configuração permanecem antigos ressentimentos decorrentes da impossibilidade de conciliar diferentes projetos de vida. Outra camada de tensão é adicionada ao relacionamento do trio através da angústia de Bernardo, autor de um best seller que teme ter a sua fonte de inspiração denunciada.



Na abordagem dos intrincados vínculos travados entre os protagonistas Eduardo Vaisman não chega a contribuir com um novo olhar. E a questão ética que assombra Bernardo se revela injustificada. A história é apresentada por meio de fragmentos referentes a instantes temporais diversos da relação travada por Russell, Anna e Bernardo, mas a opção pela não-linearidade, realçada na montagem de Ana Teixeira, não confere maior interesse ao todo.



O espectador pode enveredar por uma apreciação periférica por meio do comentário atual lançado pelo diretor acerca da crise enfrentada pelos jornalistas. Esta é a profissão dos três personagens, representantes de estágios variados da carreira. Eles acabam se afastando da redação de jornal para assumir outras funções – Bernardo se torna escritor, Anna vira editora e Russell adere a um exílio voluntário ao assumir os negócios na fazenda da família. Eventuais farpas despontam, a exemplo da menção ao fato de Anna costumar se dedicar ao lançamento de literatura espírita.



Vaisman, que já assinou o ótimo curta-metragem Dedicatórias (1997), também se preocupa em diferenciar os personagens na esfera sócio-econômica – a escalada de Bernardo, do apartamento tipicamente bagunçado ao conforto proporcionado pelo sucesso, a elegância de Anna, sempre envolta em atmosfera refinada, e a reclusão de Russell na amplidão da propriedade familiar.



Vencedor do júri popular no Festival de Gramado de 2010 e dos prêmios de melhor filme e direção no Festival de Cinema Brasileiro de Miami, 180º carece de uma concepção mais rigorosa, em especial no que se refere à falta de consistência do roteiro e dos próprios personagens. Sua salvação está na apreciável naturalidade que marca o desempenho do elenco, que sustenta embates contundentes, e justifica a ida ao cinema. Se Felipe Abib desponta como um rosto menos conhecido nas telas, Eduardo Moscovis e Malu Galli já tinham se destacado – ele em Cabeça a Prêmio (2009), de Marco Ricca, e ela em Achados e Perdidos (2005), de José Joffily.



Texto publicado no jornal O Globo em 15/09/2011.

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