Críticas


À BEIRA DO CAMINHO

De: BRENO SILVEIRA
Com: JOÃO MIGUEL, DIRA PAES, ANGELO ANTONIO, VINICIUS NASCIMENTO
09.08.2012
Por Susana Schild
AMIGOS DE FÉ PELAS CURVAS DAS ESTRADAS

Breno Silveira gosta de pisar firme no acelerador das emoções fortes de pessoas simples. Foi essa a marca de seu filme de estréia, Dois filhos de Francisco – A história de Zezé di Camargo e Luciano (1995), com 5 milhões 300 mil espectadores. À beira do caminho, seu terceiro longa, tem vários ingredientes para se aproximar do feito da dupla sertaneja: personagens sofridos em busca de redenção, recortes do interior do país, relações transformadoras e, sobretudo, música, muita música. O eleito da vez é o “Rei” Roberto Carlos, liga pela estrada afora de um homem em fuga do passado e de um menino em busca de um futuro.



A história tem ecos de Central do Brasil na contramão geográfica (desta vez, do Nordeste para o Sudeste). Como no filme de Walter Salles, Duda (Vinícius Nascimento) acaba de perder a mãe e ‘adota’ uma desconhecida para guiá-lo até o pai desconhecido. Duda tem o mesmo sonho e embarca em um caminhão no interior pernambucano rumo a São Paulo. Apesar da carranca de poucos amigos, o motorista João (João Miguel) aceita a convivência forçada. Duda é irresistível e logo se revelará um ‘amigo de fé, um irmão, camarada’. Ao entoar a canção, o garoto toca o nervo exposto do guardião involuntário que traz como única pista de sua amargura um DVD do ‘Rei’ na bagagem.



Duda podia estar sozinho à beira do caminho, mas sua trajetória tem paralelos em produções recentes européias – como O menino da bicicleta, Neves do Kilimanjaro, O Porto. Apesar de abordagens e circunstâncias tão diferentes, esses filmes mostram a luta de garotos desamparados que dependem da generosidade de estranhos para sobreviverem.



Com argumento de Lea Penteado, roteiro de Patrícia Andrade e colaboração de Domingos de Oliveira, À beira do caminho propõe uma jornada rumo à superação. Fortalecido pelo novo ‘amigo de fé’, o caminhoneiro revisita lugares e pessoas. O encontro com a ex-namorada Rosa (Dira Paes) injetará calor feminino em trama até então basicamente masculina. O passado de João passa a ser revelado por cenas cada vez mais esclarecedoras. Os momentos cruciais são embalados por sucessos inapeláveis do Rei , como À distância e Você Foi, este em inspirada dança entre Dira Paes e o menino



À Beira do caminho tem em João Miguel um contraponto a eventuais excessos melodramáticos: é com notável economia que o ator exibe dores e alegrias, em um amolecimento sutil e gradual, demarcado por placas de cidades e inscrições de pára-choques de caminhões.



Exibindo amplo domínio técnico, a começar pela fotografia de Lula Buarque de Holanda, o filme talvez derrape em algumas curvas pela insistência em acoplar e ilustrar canções auto-explicativas a situações já por si potencialmente dramáticas. Em busca de uma rota alternativa à boa parte da produção nacional atual – marcada por dramas urbanos graves ou comédias televisivas de apelo erótico - À Beira do caminho aposta no triunfo dos bons sentimentos sobre o cinismo. E dá-lhe de Roberto Carlos, pelo menos até Gonzaga – De Pai para filho, o próximo filme de Breno, bater nas telas, ainda este ano.



Publicada no jornal O Globo em 9/08/2012

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