Em sua estreia como cineasta, a ex-modelo Carolina Sá enfrenta um desafio comum a boa parte da recente safra de documentários: tornar de interesse público o que é íntimo e privado. "Uma longa viagem", de Lucia Murat, "Diário de uma busca", de Flávia Castro, e "Stories we tell", de Sarah Polley, são exemplos bem-sucedidos de filmes em que o baú de memórias dos realizadores serve como ponto de partida para se atingir algo que transcenda a mera exposição de seus diários pessoais.
Há, na matéria-prima utilizada por Carolina em "Construção", elementos de sobra que fazem com que o espectador se identifique e se interesse pelo que está sendo contado. São os filmes em Super 8, gravações de áudio e escritos deixados por seu pai, o arquiteto Marcos de Vasconcellos, falecido em 1989, quando Carolina ainda era adolescente. Crítico ferrenho do crescimento urbano desordenado do Rio de Janeiro nos anos 70, Marcos viu ruírem seus ideais de uma arquitetura voltada para o coletivo e foi marginalizado. A lucidez de seu discurso encontra eco frente às atuais transformações na cidade, tornando-o cada vez mais utópico. Ao mesmo tempo, Marcos manifestava sua dor por conta da separação da mãe de Carolina e o iminente sofrimento dos filhos, numa troca de cartas lancinante.
É um material tão rico que acaba sendo comprometido pela tentativa frustrada de conectá-lo com a história da primeira viagem de Branca, a filha de Carolina com o músico cubano René Ferrer, a Havana, em 2008. Imagens das ondas batendo no Mallecón, da fila na sorveteria Copellia, de uma refeição em família e dos interiores mal conservados dos apartamentos em que vivem os cubanos não conseguem exprimir muito mais que o contraste com os amplos espaços verdes e arejados dos filmetes realizados por Marcos na década de 70, e com o seu discurso sobre a renovação urbana.