Tese sobre um homicídio é o segundo filme do diretor Hernán Goldfrid e tem como atrativo de bilheteria para uma determinada faixa de público a presença do ator Ricardo Darín.
Outro ponto de interesse comercial é a trama aproximada ao estilo "policial", talvez mais bem definida como sendo um thriller psicológico. Este gênero, tradicionalmente norteamericano, nem sempre consegue bons resultados em outras cinematografias, mas o cinema argentino encontrou no romance original homônimo do portenho Diego Paszkowski matéria-prima estimulante – embora o escritor considerasse este livro de difícil transposição para as telas. O livro é de 1999 e o romancista já recebeu elogios por nomes icônicos da literaura de seu país, tais como Bioy Casares e Tomas Eloy Martínez
Seu enredo lembra alguma coisa de um antigo argumento que Friedrich Dürrenmatt escreveu para um obscuro filme suíço de 1958 que, curiosamente, já rendeu mais quatro adaptações, sendo a mais conhecida com direção de Sean Penn em 2001; e resultou em um romance do próprio Dürrenmatt - publicado entre nós pela Ed. Civilização Brasileira nos anos 1960 com o título de "A Promessa".
Mais importante do que descobrir quem cometeu um bárbaro assassinato é descobrir se o advogado Roberto Bermúdez (Darín), que atualmente trabalha apenas como professor de pós-graduação e escrevendo livros de Direito Penal, tem razão em sua suspeita referente a um aluno que conheceu quando ainda era criança, filho de um casal amigo, cujos pais vivem praticamente separados. Este rapaz, Gonçalo (papel de Alberto Ammann), é inteligente, um tanto pretensioso e mobiliza alguma antipatia por parte do professor.
Como é costume em enredos do gênero, algumas coisas são omitidas ou vagamente sugeridas para que as suspeitas do público sejam levadas em diferentes direções. É assim que uma breve menção ao fato de o pai de Gonçalo ter feito um exame de paternidade deixa no ar a hipótese de Bermúdez ter tido um caso com a mãe de Gonçalo. E até mais do que isso, mas nada é mencionado explicitamente no filme.
Do mesmo modo, um mesmo comentário feito em diferentes momentos por dois colegas do catedrático sobre um antigo caso no qual Bermúdez cometera um equívoco serve para que a balança do julgamento da plateia vá em direção oposta aos dados que o personagem de Darín está recolhendo.
Outras “pistas” (ou anti-pistas?) são sugeridas de modo mais tênue: Bermúdez telefonando para sua ex-mulher em plena madrugada, o motivo real desta separação (ele informa uma questão de aceitar ter filhos ou não, mas...), a opinião dela sobre as suspeitas que ele mantém sobre o aluno - e em que ela trabalha (é psicanalista, psiquiatra e/ou perita criminal?...)
O espectador é instigado a procurar e considerar esses e outros detalhes, se importantes ou não, desde o início do filme quando o próprio mestre, em uma aula, comenta a importância dos detalhes de um processo para a sentença que o juiz vai proferir.
Na verdade, há um jogo de gato e rato entre o roteiro e a plateia cuja atenção é administrada cuidadosamente.
Um ponto menos favorável é a caracterização de Gonçalo: parece ter sido pedido ao ator que construísse um tipo merecedor de alguma suspeita um tanto sofisticada, o que prejudica um pouco o desempenho de Ammann - que já vimos em “Lope”, dirigido por Andrucha Waddington (2010). Isso deixa quase todo o filme a cargo de Darín (com uma contribuição discreta de Calu Rivero fazendo a irmã da moça assassinada). O que não é problema para o protagonista que prova estar em outro ótimo momento de sua carreira.
A fotografia de Rolo Pulpeiro é muito boa e mostra progressos do fotógrafo em relação ao seu trabalho em "Um Conto Chinês". A música, com ênfase na percussão, do espanhol Sergio Moure é ótima - mas poderia ter sido utilizada com mais economia (e teria mais impacto). A edição de Pablo Barbieri Carrera é bem funcional, com destaque para a cena de “dança aérea” em um galpão que é sensacional.
Questões éticas de condutas profissionais (ou semi-profissionais), a antiga discussão sobre como saber onde está a verdade (com uma alusão visual a "Cidadão Kane") e o que, de fato, as Leis perseguem (a justiça? mesmo? ou servem apenas à manutenção de poderes?) deixam de ser mencionadas aqui com mais detalhes, pois ficariam expostos muitos pontos do enredo que não interessam ao futuro espectador que ainda vai conhecer o filme.