Críticas


AMORES INVERSOS

De: LIZA JOHNSON
Com: KRISTEN WIIG, GUY PEARCE, NICK NOLTE
28.08.2014
Por Luiz Fernando Gallego
O roteiro preserva o espírito do original literário fazendo modificações que funcionam bem na tela.

Mais uma vez o Cine Joia evita que, no Rio de Janeiro, só através do lançamento em DVD possamos travar contato com um filme interessante e certamente melhor de ser visto em sala de cinema: um enredo razoavelmente simples, ainda que cheio de detalhes importantes, e um conjunto de personagens mais ou menos banais, aos quais bons atores dão verossimilhança, são responsáveis pela atenção mantida enquanto assistimos o desenrolar inabitual de uma história bem roteirizada a partir de um conto da escritora canadense Alice Munro, Prêmio Nobel de Literatura em 2013.

O roteirista Mark Poirier (que também tem livros publicados) neste, que é seu terceiro trabalho no gênero, mostra-se fiel ao esqueleto básico do enredo criado por Munro, mas também soube ser criativamente menos fiel em uma série de aspectos secundários da trama que acabam por ganhar maior protagonismo e funcionam bem na transposição para a tela.

O espírito da narrativa de Munro também é preservado na forma elíptica que encontramos no conto original: e é assim também que a narrativa cinematográfica foca no essencial deixando que o espectador preencha facilmente as lacunas entre um momento e outro da história, sejam eles próximos ou mesmo distantes no tempo. Por outro lado, a câmera se detém em alguns trechos nos quais a personagem central, Johanna, silenciosamente, apenas faz aquilo que aprendeu a fazer: servir. Servir lavando, cozinhando, esfregando o chão, etc.

Também de modo diverso a como Munro construiu seu texto, o filme faz opção pelo suceder cronológico dos fatos, o que cai bem na tela, assim como deixa de fora aspectos pretéritos da vida de Johanna mencionados no conto, escolhendo centrar no aqui-e-agora de sua vida - e do enredo, com vantagens -, deixando-nos apenas com a informação de que desde os 15 anos ela trabalhava cuidando de idosos. O prólogo, delicado (e ao mesmo tempo bastante direto) é inspirado e mostra quando e porque ela teve oportunidade de mudar sua – digamos – clientela, passando a trabalhar na casa onde uma adolescente mora com o avô materno desde a morte de sua mãe; já que o pai, desajustado, não quer ou/e não tem mesmo condições de cuidar da filha.

Alguns personagens surgem mais simpáticos no filme, outros menos, e até mesmo aparecem dois tipos secundários, inexistentes no original. Mas a pequena anedota que Munro desenvolveu habilmente em palavras está preservada plenamente em imagens.

A partir deste muito bem desenvolvido roteiro, a diretora Liza Johnson, em seu segundo longa, mostra-se sensível nos enquadramentos e na escolha de onde posicionar a câmera, captando as nuances de interpretação do ótimo elenco e tornando a evolução do plot verossímil.

Kristen Wiig, mas conhecida por participação em comédias, faz uma bela composição para Johanna e seu desempenho é um dos destaques do filme, sabendo dosar sua personagem com pequenos detalhes que podem mudar discretamente ao longo da história. Guy Pearce evita o estereótipo em que seu personagem poderia cair na pele de outro ator menos perspicaz para a construção de seu tipo, tal como ficou no roteiro. Em papéis menores, dois atores bem conhecidos, Nick Nolte e Jenniffer Jason Leigh, ajudam a manter o bom nível das interpretações, assim como Christine Lahti e as jovens Sami Gayle (personagem um pouquinho mais carregada) e Hailee Steinfeld (de Bravura Indômita na refilmagem).

O take final sobre o qual correm os últimos créditos mantém a simplicidade e elegância desta boa surpresa cinematográfica.

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