Críticas


O HOMEM IRRACIONAL

De: WOODY ALLEN
Com: JOAQUIN PHOENIX, EMMA STONE, PARKER POSEY
27.08.2015
Por Luiz Fernando Gallego
Algo supérfluo em relação a outros filmes do cineasta sobre desvios éticos "dostoievskianos", mas mantém o interesse

Este é o quarto filme em que Woody Allen aborda graves decisões morais equivocadas e, dentre estes, o segundo em que o acaso tem um importante papel no desfecho do enredo. Nada demais em repetir temas: seu cultuado Bergman, inspirador de filmes de Allen quase ao ponto do plágio, teria feito mais do que a tão propalada "trilogia sobre o silêncio de Deus”: desde O Sétimo Selo, passando por A Fonte da Donzela e pela famosa trilogia composta por Através de um espelho, Luz de Inverno e O Silêncio, e concluindo na síntese de Gritos e Sussurros, a ausência da tão anunciada “misericórdia divina” se presentificava como lacuna no vale de lágrimas em que os personagens bergmanianos não colhiam nada além de morte e humilhações. Não creio que Allen tenha planejado uma “tetralogia” sobre os desvios éticos do ser humano, mas o tema já se mostra reincidente como uma obsessão, sendo que em sua primeira (e até agora mais bem sucedida) elaboração, Crimes e Pecados, também havia toques sobre a ausência, silêncio ou cegueira de um suposto Deus, cristão ou judaico.

Talvez Match Point tenha sido o mais popular destes filmes, enquanto O Sonho de Cassandra ficou relegado à condição de filme "menor” na extensa obra de Allen - na qual O Homem Irracional é seu 44º longa para salas de cinema. Só que um “filme menor” de Allen pode ser muito mais interessante do que a enxurrada de mediocridades jogadas nas telas a cada semana. E O Homem Irracional talvez seja ainda “menor” do que Cassandra, mesmo que não deixe de manter o interesse do espectador enquanto rola na tela.

A questão que pode ser levantada é uma (até certo ponto) instigante pressa do roteirista-diretor ao empurrar a ação para a frente na segunda metade do filme - depois de ter sido um tanto reiterativo na criação do ambiente e tipificação dos personagens, elementos a partir dos quais pôde estabelecer os fatos centrais da trama. Assim, o tédio do personagem central, ‘Abe’(Joaquin Phoenix), a oferecida disposição sexual de 'Rita' (Parker Posey em excelente composição) e as negativas de 'Jill ' (Emma Stone) quanto à amplitude de sua fascinação por ‘Abe’ quase extrapolam o quanto teria sido suficiente para informar o espectador sobre as premissas do enredo. Já quando a ação propriamente dita se instala não há muito “recheio” no roteiro para as atitudes dos personagens até o rápido desfecho e ausência de explicações detalhadas sobre o que pode ter acontecido com tal ou qual protagonista. Não dá para ter certeza se Allen está mais cansado ou se apenas quis ser econômico no cerne do pretendeu - mais uma vez - demonstrar: seja como for, não há como fugir da aparência de certo esquematismo, tanto na caracterização inicial que se alonga, como na ação final que se precipita.

Neste sentido, O Homem Irracional pode parecer supérfluo em relação ao trio de filmes anteriores sobre os mesmos temas "dostoievskianos", exceto pela variável na abordagem do acaso.

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