Críticas


TRUMBO – LISTA NEGRA

De: JAY ROACH
Com: BRYAN CRANSTON, DIANE LANE, HELEN MIRREN, MICHAEL STUHLBARG.
30.01.2016
Por Luiz Fernando Gallego
A perseguição McCarthysta é o grande assunto deste filme bem interpretado por Bryan Cranston.

Antes deste Trumbo-Lista Negra, Hollywood já se dedicou (pelo menos) três vezes ao tema do McCarthysmo que perseguiu simpatizantes do comunismo nos primórdios da guerra fria e durante mais de uma década. Alguns dos investigados já estavam decepcionados e afastados do ideário marxista, mas tinham que depor respondendo se “eram ou tinham sido” comunistas - e, num caso e noutro, eram estigmatizados como grandes traidores da pátria norte-americana, além de obrigados a denunciar quem mais “era ou tinha sido...”. Seus nomes passavam a fazer parte de uma não-declarada “lista negra” que, entretanto, existia na prática: impedidos de serem contratados para novos trabalhos, eram privados do ganha-pão – enquanto deixavam muitos filmes sem os bons serviços que prestariam ao cinema caso pudessem prosseguir com suas carreiras.

Diretores, atores, e mais do que todos, os roteiristas eram visados como capazes de inserir propaganda socialista em seus enredos. A coisa foi tão patética que, apenas por terem trabalhado em filmes de propaganda americanos simpáticos à Rússia durante o tempo em que Estados Unidos e União Soviética eram aliados contra o nazismo, gente bem alienada de política foi investigada por supostas – e raramente existentes - simpatias para com o novo inimigo da águia americana pós-II Guerra: a URSS.

Em 1976, Martin Ritt (que esteve na lista negra) dirigiu, com Woody Allen encabeçando o elenco apenas como ator, The Front (Testa-de-ferro por acaso); quinze anos depois Robert De Niro interpretou um fictício cineasta perseguido pelo tal “Comitê de Atividades Anti-americanas” em Culpado por Suspeita, dirigido por Irwin Winkler; e mais recentemente, mas já há dez anos, George Clooney dirigiu seu melhor filme, Boa Noite e Boa Sorte - que chegou a ter várias indicações ao Oscar, sem nenhuma premiação que lhe fizesse merecida justiça.

Pode ter havido outros filmes de ficção em que estes fatos tenha aparecido com mais ou menos destaque, mas estes três filmes, aos quais veio agora se somar Trumbo, enfrentaram o assunto de frente, o que sempre pode reabrir feridas: grandes nomes do cinema ficaram mal na foto ao se colocarem ao lado dos políticos de direita, sendo que o futuro presidente Richard Nixon foi um que se destacou na caça às bruxas. Alguns desses políticos acabaram denunciados - e mesmo presos - por corrupção nem tanto tempo depois; e Nixon, como se sabe, foi levado à renúncia para não sofrer impeachment quando chegou à Presidência - por safadezas no caso Watergate.

O filme atual, assinado por Jay Roach, até agora um diretor de comédias eventualmente bem sucedidas comercialmente, não se destaca pela forma de conduzir os fatos narrados, não indo muito além do feijão-com-arroz de cinebiografias, tendo seu maior trunfo na boa história que aborda e nos desempenhos - com destaque merecido para o ex-“Breaking Bad” Bryan Cranston, espetacular como o roteirista Dalton Trumbo, talvez o mais famoso dos perseguidos por ter recebido prêmios sob pseudônimos na época em que seu nome não podia aparecer nos créditos dos filmes. John Goodman, igualmente excelente, e Helen Mirren, borbulhante do mal, também brilham.

Michael Stuhlbarg (que não teve grandes papéis desde Um Homem Sério, dos irmãos Coen) está bem como Edward G. Robinson (1893-1973), mesmo sem lembrar fisicamente o antigo ator de “filmes de gangster”, exceto quando usa um cavanhaque e barba que lhe deixam mais parecido com o original. Aliás, cabe assinalar que a conduta atribuída a Robinson pelo roteiro não tem nenhuma base real, manchando a imagem do ator sem nenhuma justificativa. Muita gente acabou denunciando seus colegas, pressionados ou mesmo por ideologia anti-comunista (o caso mais notório é o do grande cineasta Elia Kazan), mas o site IMDb assinala que o que é mostrado no filme sobre Robinson é um “grave erro”.

Salvo alguns problemas de fidelidade aos fatos reais, ora denegrindo Edward G. Robinson, ora idealizando um pouco o biografado central, o filme cumpre bem seu papel na reconstrução da época, mesclando cenas de arquivo às cenas filmadas. Uma certa “barriga” no meio do filme (quando destaca a vida familiar de Trumbo) não chega a prejudicar o resultado geral, já que o terço final recupera as qualidades do terço inicial. De qualquer modo, estimula a vontade de ver ou rever tanto o excelente Boa noite e boa sorte como o mais ficcional - e nem por isso menos fiel - Testa-de-ferro por acaso que, em 1975 - quando foi filmado (ano em que também foi definitivamente extinto o “Comitê de Atividades Anti-Americanas”) - usou no elenco, além de Woody Allen - que não tinha idade para ser perseguido pelo McCarthysmo no final dos anos 1940 e na década de’50 – atores como Zero Mostel e outros que comeram o pão que o então senador McCarthy amassou, como foi o caso do roteirista Walter Bernstein, outra vítima do período que também, como Trumbo, passou a ter que escrever sob pseudônimos nos anos 1950.

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