Em se tratando de cinema de terror o Brasil tem apenas um indiscutível nome no gênero, o inventivo Zé do Caixão. Tirando o Zé, temos histórico, mas de qualidade, apenas algumas tentativas particulares bem sucedidas – como o Walter Hugo Khoury de Estranho Encontro (1958) e O Anjo da Noite (1974) e o Carlos Hugo Christensen de Enigma para Demônios (1975). Este O Caseiro (2016), estreando em circuito esta semana, pertence a uma nova leva de cineastas cultores do horror.
Há mesmo toda uma nova geração de diretores brasileiros mobilizada em torno do gênero, gente como Juliana Rojas (Sinfonia da Necrópole), Marco Dutra (Quando Eu Era Vivo), André de Campos Mello e Marcos De Brito (Condado Macabro), Rodrigo Aragão (Mar Negro), Pedro Biscaia Filho (Nervo Craniano Zero), todos combinando dosagens, experimentando e às vezes até abusando, mas sempre com resultados curiosos.
Enfim, o nicho existe, só falta o exibidor perder o preconceito pra explorar o filão.
O Caseiro tem potencial para ajudar a furar esse bloqueio. Verdade que não se trata de um filme de grandes arroubos criativos, mas o diretor Julio Santi, aos poucos, toma o pulso do espectador e cativa. São poucos atores em cena, ambientações modestas, e a direção de Santi tira o máximo do mínimo, contornando os clichês com habilidade, e evitando aquela histeria usual típica do gênero.
Em vez do desfile de fantasmas tradicional, com a mecânica forçada de reserva de um susto a cada cinco minutos, Santi investe na atmosfera, aumentando a tensão e o horror por efeito cumulativo.
Um crime tétrico origina todo o drama: o tal Caseiro joga um corpo no fundo de um lago e se enforca inexplicavelmente na chácara de família de um empresário. Um menino se depara com o cadáver balançando na corda e foge assustado.
Quem foi jogado no lago, quem era o menino, qual a relação dele com o caseiro, são perguntas que serão respondidas aos poucos. Esse é um ponto, outro que parece importar mais ao diretor é brincar com a noção de olhar, com a noção de realmente enxergar. A verdade às vezes pode estar na frente dos personagens, sem que se consiga perceber. Ou seja, uma questão de sensibilidade e perspectiva que se aplica bem em filmes de fantasmas.
Do misterioso suicídio, a ação transfere-se para uma sala de aula trinta anos depois. Um professor (Bruno Garcia) especialista no estudo fenômenos sobrenaturais, é convidado para visitar a tal chácara. Os moradores acreditam que o local talvez seja assombrado pelo espírito do caseiro e pronto: a caixa de surpresas está embrulhada para no momento certo, a entidade saltar, pregando o susto.
O melhor do filme é a perfeita noção de Santi de saber onde está pisando. Num olhar mais apressado, O Caseiro se vende como um filme de entretenimento com artesanato bem acabado, eficiente na construção dos diálogos e das situações dramática. Já quem prefere saborear as entrelinhas, encontra algumas ressonâncias. Entre as quais, o prazer do diretor em brincar com o que está em quadro e o que se subentende que está fora dele, no extracampo, algo que Santi se inspira no Shyamalan de O Sexto Sentido e no Amenabar de Os Outros para compor.
Na pré-estreia do filme semana passada, a sala estava lotada e o público respondia favoravelmente a cada susto. O marketing também vem se propagando com força nas rádios e na web. O sucesso do filme abriria o precedente para produtores e exibidores olharem para esse novo mercado com carinho. Vamos torcer por O Caseiro.