A principal impressão que "Mate-me por favor" deixa, ao término da sessão, é a de que devemos guardar bem o nome da jovem diretora Anita Rocha da Silveira. Em meio a excessos perdoáveis em um longa de estreia, chama a atenção o talento acima da média na maneira como ela filma e demonstra total controle de sua obra. Anita mostra personalidade em cada uma de suas escolhas e assume o risco por tentar contar uma história que envereda por rumos distintos, sem necessariamente chegar a algum lugar concreto.
Não dá para aprisionar “Mate-me por favor” dentro das convenções de cinema de gênero. Não é suspense pois não há suspense algum, mesmo em se tratando de uma história de “serial killer”; tampouco é terror, pois não há nada aterrorizante, nem real, nem psicológico. O que se tem é um retrato geracional de adolescentes de classe média alta da Barra da Tijuca enclausurados entre espigões e muros da escola, sitiados entre ruas e estações de BRT pouco acolhedoras e reféns da paranoia do desconhecido que habita o matagal vizinho.
É interessante observar como, mais uma vez no cinema brasileiro recente, a geografia urbana se impõe quase como um personagem que dialoga com os dilemas existenciais dos protagonistas. É nesse cenário que Bia (Valentina Herszage, grata revelação) vive a sua fase de descobertas – o amor, o tédio, a morte. Dilemas universais, comuns a quaisquer adolescentes, aqui soam distantes do lugar comum graças à forma encontrada por Anita para apresentá-los, jogando o tempo todo entre o naturalismo e o artificialismo delirante da mise en scène, que inclui vinhetas musicais e um templo evangélico com cruz de neón roxa embalado pelo funk religioso.
Sem uma estrutura dramática forte o suficiente, o roteiro muitas vezes deixa no espectador a sensação de estar diante de cenas soltas que parecem atender unicamente à necessidade de abrir espaço para um certo “exibicionismo” formal. Mas se esse “exibicionismo” formal nem sempre funciona, é ele que garante o interesse e a admiração daqueles que procuram, mais do que uma história bem contada, a oportunidade de serem surpreendidos esteticamente. Neste aspecto, uma certeza se pode ter durante a sessão de “Mate-me por favor”: dificilmente você adivinhará como será a sequência seguinte. Do uso bastante criativo da ótima trilha sonora de Bernardo Uzeda à fotografia de João Atala, a diretora sabe como driblar um dos grandes males do cinema contemporâneo: a previsibilidade. Em se tratando de alguém que está dando os primeiros e já tão largos passos, isso soa bastante promissor.