Segunda Palma de Ouro em Cannes do veterano Ken Loach que neste filme denuncia a desumanização do sistema de auxílio-doença britânico: seja pela transferência para a internet dos passos que o necessitado precisa dar (sem familiaridade com a internet? Dane-se!) para solicitar um auxílio-doença ou recorrer de um indeferimento injusto, seja pela própria transformação das pessoas que atendem o público em seres robotizados que seguem protocolos rígidos, insensíveis ao bom senso, sem nenhuma capacidade de identificação com o sofrimento alheio. Não que o personagem central seja um choramingas: Daniel é um idoso muito ativo, exceto por ter sofrido um grave problema cardíaco; em recuperação, ainda tem recomendação médica de não retornar ao trabalho por enquanto - o que ele até desejaria, e muito.
Paralelamente ao labirinto burocrático em que Daniel vai sendo enredado, Katie, uma jovem mãe solteira de dois filhos, passa por enormes vicissitudes com as quais Dan empatiza, tentando minimizar os problemas dela, mesmo sem conseguir resolver as próprias adversidades que “o sistema” lhe impõe.
Como sempre, Loach é bastante persuasivo, demonstrando didaticamente as falhas das instituições inglesas quanto ao real apoio social que - no caso, não - é oferecido aos necessitados.
Por mais realistas que sejam as situações desenvolvidas neste roteiro, fica, entretanto, a sensação que desta vez Loach pesou a mão no maniqueísmo para reafirmar suas críticas, por mais justas e pertinentes que sejam. Não é dizer que os obstáculos que Daniel e Katie enfrentam sejam inverossímeis, o que pode ser questionado é o acúmulo de descaminhos que o enredo reserva para ambos, o que pode acabar soando implausível pelo excesso de desgraças sucessivas, pontificando no lance algo melodramático do encontro de Daniel com Katie em uma situação indigna.
Por outro lado, não há como negar que o tarimbado diretor consegue envolver totalmente a plateia nos dramas retratados, contando para isso com desempenhos absolutamente cativantes de Dave Johns e Hayley Squires. Mereceriam justíssimos prêmios, sem menosprezar as crianças que fazem os filhos de ‘Katie’, especialmente a menina Briana Shann.