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FESTIVAL DO RIO 2012: O MUNDO DIANTE DELAS

29.09.2012
Por Carlos Alberto Mattos
ENTRE MISSES E EXTREMISTAS

Uma das formas de se reconhecer um grande documentário é ver como ele usa o micro para chegar ao macro. O Mundo Diante Delas (The World Before Her) é um desses casos luminosos. A diretora Nisha Pahuja, indiana de origem mas criada em Toronto, abordou duas realidade femininas indianas opostas mas com alguns inquietantes pontos em comum. De um lado, as concorrentes ao título de Miss Índia 2011, jovens identificadas com um projeto de modernização do país. De outro, as adolescentes e moças que frequentam um acampamento do grupo fundamentalista hindu Durga Vahini, célula de extremismo religioso e nacionalista.



Oriente e Ocidente, campo e cidade, tradição e modernidade se confrontam através da montagem do filme, baseando-se unicamente na observação dos respectivos processos e em conversas com algumas personagens. De certa forma, os discursos se opõem pelo radicalismo. O concurso de beleza em Mumbai evidencia a mulher como produto e promove um ideal de liberdade e ascensão social ilusório e excludente, num país caricaturalmente machista e patriarcal. Já o treinamento militar e marcial das jovens de Aurangabad visa restaurar uma pureza fascista guiada pelo ódio contra muçulmanos, cristãos e tudo o que possa representar uma perda do “respeito pela mulher indiana”.



As questões se aprofundam mediante as personagens escolhidas para serem as protagonistas. Entre as misses, uma jovem de Jaipur que vive a expectativa da disputa com a cumplicidade dos pais. Entre as extremistas, a masculinizada e iracunda Prachi Trivedi, que aceita as surras do pai simplesmente porque ele a deixou viver, mesmo sendo menina. O assassinato de filhas e a perseguição feroz a mulheres independentes são comuns entre os hinduistas radicais.



O barril de pólvora da guerra religiosa doméstica já estourou muitas vezes na Índia dos últimos anos. A ocidentalização e a cultura pop também avançam a passos largos. Daqui a pouco Gandhi vai precisar ressuscitar para acalmar o país, se não for novamente assassinado pelos inimigos da não-violência.

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