HOMENS LIVRES, de Ismaël Ferroukhi
É famosa a frase de Sartre dizendo que (na França) “nunca fomos tão livres como durante a ocupação nazista”. É claro que a liberdade à qual ele se referia era a liberdade de escolher que posição tomar: submeter-se ao invasor ou lutar contra. Ele exemplificou isso através de sua versão do mito de Orestes na peça “As Moscas” e, seu oposto (a falta de liberdade) no roteiro do filme Les Jeux sont faits, 1947(Existe a tradução brasileira como Os dados estão lançados em livro).
Suponho que o título Les Hommes Libres (no original francês), o segundo longa do diretor e roteirista Ismaël Ferroukhi, tenha como referência a frase sartreana. O enredo trata de um argelino que inicialmente vende objetos contrabandeados a outros árabes imigrantes e ilegais em Paris. Mais adiante ele será cooptado para espionar o que se passa em uma mesquita, suspeita de dar identidades árabes falsificadas para judeus em fuga (sim, o filme garante que houve auxílio de muçulmanos a judeus). Mas em seguida ‘Yunes’ terá que escolher ficar nessa posição mesquinha ou aderir à Resistência.
No papel central o ator Tahar Rahim, em composição bastante discreta, mostra mais uma vez sua versatilidade: depois de chamar a atenção em O Profeta (2009), no mesmo ano em que rodou este Homens Livres esteve espetacular, em construção de personagem totalmente diversa para Amor e Dor, exibido no Rio este ano sem muita repercussão. Michael Lonsdale é quase sempre discreto e faz isso muito bem, desta vez no papel de um religioso muçulmano. O trio central de atores é completado por Mahmud Shalaby, um palestino que vive em Israel e aqui interpreta um judeu. Ele também é músico e se é ele mesmo quem canta as músicas árabes que seu personagem interpreta, vale o destaque.
Por outro lado, a discrição dos atores, adequada aos personagens e situações corresponde à direção discreta de Ismaël Ferroukhi, responsável pelo resultado correto do filme, ainda que sem maior brilho como poderíamos esperar no tratamento de um assunto que é, no mínimo, curioso e emocionante. Um ponto fraco do filme está na personagem de Lubna Azabal (atriz de Incêndios), um tanto periférica à ação central e sem destaque para os efeitos que o roteiro sugere que ela provoca no personagem principal. Mesmo assim, o cômputo geral é de um filme digno, ainda que um tanto disciplinado em relação às situações bastante mobilizantes que são mostradas.