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FESTIVAL DO RIO 2012: O GORILA

05.10.2012
Por Nelson Hoineff
ELENCO GLOBAL, MIOPIA TOTAL

O Gorila, de José Eduardo Belmonte



Por menos razoável que isso possa parecer, o entendimento do mercado pode ser mais complexo do que o entendimento de uma construção dramatúrgica. O mercado de cinema é complexo, no meio de outras razões, porque entre os vetores que o compõem está o imponderável. O sucesso ou fracasso de um lançamento pode ser determinado (ou na pior das hipóteses amplificado) por fatores tão prosaicos como as condições climáticas em cada cidade na data da estréia, os demais lançamentos na mesma ocasião e até o trânsito. Ele é intrincado também porque cada tamanho de lançamento sofre impactos diferentes do marketing, da recepção crítica, do boca a boca. A desinformação sobre as razões que levam um filme a ter um bom ou mau desempenho comercial favorece o achismo e, acima dele, as relações que se estabelecem entre a qualidade, o gancho comercial e o investimento no produto e em sua comercialização. Um piloto não pode errar. Mas um analista de mercado pode dizer quanta besteira quiser e sustentá-la pelo tempo que achar necessário.



Cada lançamento bem sucedido é imediatamente convertido em modelo. No sétimo dígito do público alcançado, cada filme torna-se aquele que deveria ser feito por toda a indústria. Celebra-se então o acaso, o imponderável. E aquilo que o filme contém torna-se a receita mágica do mercado, até que o mercado prove o contrário.



Filmar o elenco da novela das oito, por exemplo, já seria uma indesejável forma de subserviência do cinema à dramaturgia produzida pela televisão. Filmar isso mal só potencializa essa posição. Anula tudo o mais que se poderia dizer sobre a conveniência do casting de novelas para um filme com pretensões de mercado.



O Gorila tem um naipe de artistas globais, como Alessandra Negrini, Mariana Ximenes e Otavio Muller. Por trás de nomes tão conhecidos, no entanto, inexiste sequer o verniz dramatúrgico presente na base do processo industrial massivo, reducionista, que impulsiona uma grande parte das novelas voltadas para o grande público. O filme não é apenas ruim. É ruim, mal feito e, se o leitor me permite a expressão tão popular quanto o filme pretende ser, chato.



Há no mínimo uma contradição aí. A mídia massiva pode ser tudo, menos entediante. Outros filmes podem sê-lo. Filmes voltados, por exemplo, para nichos que cultuem a expressão. Não, seguramente, filmes voltados para reproduzir o modelo das novelas televisivas.

O diretor José Eduardo Belmonte tem transitado com freqüência pela utopia de um cinema de mercado, com filmes como Se nada mais der certo (2009) e Bili Pig (2012). Os resultados não são entusiasmantes. Mas O Gorila sofre mais ainda com o conflito entre a tentativa de alcançar a massa e o efeito de não estabelecer com ela o pacto mínimo alcançado pela televisão. Fosse feito para a TV, O Gorila estimularia o zapping e aumentaria a audiência dos concorrentes. No cinema, ficará como mais um exemplo de como se pode pensar no mercado sem de fato enxergá-lo.

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