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O RÁDIO SEGUNDO NICOLAS PHILIBERT

11.02.2015
Por Carlos Alberto Mattos
Retrospectiva do documentarista francês traz a SP seu filme mais recente

O CCBB de São Paulo abre hoje (quarta) uma mostra com oito dos nove longas do documentarista francês Nicolas Philibert. Ele ficou famoso por aqui – e no resto do mundo – com o já clássico Ser e Ter (2002), sobre a experiência de uma pequena escola rural dirigida por um professor afetuoso. Depois de fazer sucesso, o filme foi objeto de polêmica quando o professor e alguns alunos reivindicaram direitos de imagem, afinal negados pela justiça.

Educação e comunicação formam a base do cinema de Philibert, ex-assistente de René Allio e Alain Tanner. A mostra não inclui Qui Sait?, de 1999, rodado numa escola de Estrasburgo enquanto os alunos preparavam um espetáculo sobre a cidade. Mas traz um filme sobre internos de uma clínica psiquiátrica ensaiando uma opereta (La Moindre des Choses), dois sobre museus (La Ville Louvre Un Animal, des Animaux), um estrelado por orangotango em cativeiro (Nénette) e outro sobre os atores não profissionais que um dia participaram do filme Eu, Pierre Rivière…, de René Allio (Retour em Normandie).

A programação abrange ainda Le Pays des Sourds (1991) e seu mais recente trabalho, La Maison de la Radio (2012). Esses dois filmes fazem um contraponto no uso da oralidade e do silêncio. O primeiro pretende levar o espectador a ver o mundo dos surdos através deles, utilizando a linguagem de sinais como principal ferramenta. Já La Maison de la Radio enfoca o rádio, um ambiente em que o silêncio não tem lugar. O método aqui é semelhante ao que Frederick Wiseman tem usado ultimamente para revelar os bastidores de grandes instituições de entretenimento e cultura, como o corpo de baile da Ópera de Paris, o Crazy Horse e a National Gallery. A não ser por um ou dois momentos de exceção, Philibert não usa entrevistas nem colhe depoimentos, mas apenas observa discussões de pauta, instruções de trabalho, ensaios e gravações.

A Radio France é uma rede pública francesa que engloba sete estações de rádio com programação variadíssima. Philibert espelha essa diversidade saltando livremente de um programa para outro. Assim, temos desde uma palestra sobre A Ilíada a uma entrevista com um fotógrafo de raios, passando por apresentações musicais, edição de notícias sobre a Primavera Árabe então em pauta, dramatizações, programas de auditório e cobertura do Tour de France por um repórter em motocicleta.

Os contrastes entre os assuntos e a excentricidade de alguns profissionais criam uma narrativa por vezes divertida, como na fala do programador de música clássica soterrado por suas montanhas de CDs (foto à esquerda) ou na longa pergunta de um âncora que não tem paciência para ouvir a resposta (foto no alto). Há até mesmo uma locutora cega que redige e lê seu programa em braille. Como entrevistados de programas, Umberto Eco, Jean-Claude Carrière e Edgar Morin passam rapidamente pela tela, sem qualquer privilégio em relação a outros personagens menos estelares.

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