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MENINAS

19.02.2007
Por Carlos Alberto Mattos
GRÁVIDAS DE BRASIL

Assim como Pro Dia Nascer Feliz, em cartaz nos cinemas, o doc Meninas, de Sandra Werneck, lançado no ano passado, procurou enfocar algumas raízes do Brasil atual. A gravidez adolescente nas classes menos favorecidas, fruto de um misto de inconseqüência juvenil, desinformação cultural e pressa na conquista da idade adulta, perpetua um ciclo vicioso através das gerações. O filme, momento significativo de uma onda de docs socialmente relevantes e esteticamente bem sucedidos, teve uma passagem discreta pelas salas de cinema. Lançado agora em DVD pela Videofilmes, pode chegar mais próximo do público merecido.



Sandra Werneck é uma documentarista sensível, cujo approach carinhoso dos personagens não limita o alcance do seu olhar. Não é uma novata no ofício. Antes de se consagrar com sucessos de ficção sobre dores e amores da modernidade (Pequeno Dicionário Amoroso, Amores Possíveis, Cazuza – O Tempo Não Pára), ela militou com garra no doc social. Guerra dos Meninos, feito a partir de reportagem de Gilberto Dimenstein, antecipou em vários anos a tomada de consciência do doc brasileiro a respeito da infância tragada pela violência nas grandes cidades. Ritos de Passagem (1980), Pena: Prisão (1984), Damas da Noite (1987) e Profissão Criança (1993) completam um painel vigoroso da situação de mulheres e crianças em situação de risco.



Meninas é tão bom quanto boas são as meninas em si. Evelin, Luana, Edilene e Joice não são apenas crianças gestando outras crianças. Elas vivem o melodrama com a naturalidade de um passeio na tarde. Duas delas disputam a atenção do mesmo namorado que as engravidou no mesmo período. Uma carrega o filho de um jovem que trabalha no tráfico e só aparece no filme de costas. Outra convive com a mãe também grávida e parece mais madura que esta. Para algumas, pouca diferença existe entre os filhos que esperam e as bonecas com que estão acostumadas a brincar.



É interessante saber que as descobertas da equipe foram alterando sutilmente a linguagem utilizada. Quando ficou claro que não havia ações visíveis importantes no período de gestação das meninas, mas apenas as diversas tonalidades da espera, o método da observação passou a se impor sobre o da interação. O resultado é um belo equilíbrio dos dois modos de documentar.



Nos extras, há depoimentos convencionais da diretora, da co-diretora Gisela Câmara, do roteirista Bebeto Abrantes e do produtor executivo Luís Antonio Silveira. Alguns poucos flagrantes da reunião de encerramento das filmagens são apresentados como “making of”, o que é, no mínimo, bastante impróprio.

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