Eduardo Coutinho não costuma retornar aos lugares onde rodou seus documentários. “Não gosto de voltar ao local do crime”, diz. Ou dizia, até que abrisse um precedente extraordinário com O Fim e o Princípio. A idéia de retorno sempre girou em torno desse projeto. Para começo de conversa, Coutinho regressava ao cenário da Paraíba, onde germinou a semente de Cabra Marcado para Morrer. No próprio filme, depois de conversar com seus personagens, ele revisitava vários deles para se despedir, prometendo voltar um dia para mostrar o trabalho pronto. Pouco mais de um ano depois, cumpriu a promessa.
A Volta é a principal atração extra do DVD de O Fim e o Princípio, que acaba de ser lançado pela Videofilmes. Coutinho e equipe reencontram seus personagens, insistem para que compareçam à exibição no grande terreiro de Araçás. A platéia ri muito com o que os velhos falam na tela. Mas nem todos arriscam ir ao “cinema”, deixando a casa à mercê de supostos ladrões. Coutinho, então, vai levar um dedo de prosa com os faltantes. Ouve de Zequinha Amador mais um de seus sonetos. Ganha de Dona Mariquinha mais uma declaração de afeto: “Minha dor de cabeça até passou quando você chegou. Amor é bicho bom”. Acompanha Assis à casa de Dôra, sua mãe de criação, e testemunha uma conversa emocionada. Juntos, Coutinho e Rosa lembram Zé de Souza e Leocádio, que morreram no interregno. O fim dos homens e o princípio da ausência, assim como os mistérios do céu e da terra, são constantes na humilde filosofia dos velhos de Araçás.
Outro extra nos apresenta personagens que acabaram excluídos da edição do filme. Deve ter sido duro cortar a desbocada Maria de Chicute, que tem pena de matar galinha mas diz ao “homem dos filmamentos” que adoraria ter um revólver para matar ladrão. Ou Expedito, para quem os índios são os filhos que Eva escondeu do Pai Eterno para abrandar sua imagem de pecadora. Há, ainda, uma entrevista de Nenê Grande a João Moreira Salles, na fase de pré-produção, onde ela dá mostras de uma incrível habilidade com os calendários.
O DVD amplia gostosamente a nossa convivência com os personagens do filme. É bom voltar a eles, no rastro de uma experiência onde Coutinho radicalizou sua proposta de usar o doc como instrumento de descoberta e encontro com gente de verdade.