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A RAINHA DIABA

11.10.2004
Por Carlos Alberto Mattos
MALDITO E POPULAR

Junto com o DVD de A Rainha Diaba, recentemente lançado no mercado pelo CTAV do Ministério da Cultura, é toda uma conjuntura artística e mítica do cinema brasileiro que vem à tona. Em princípios da década de 1970, o cinema mainstream mantinha diálogo freqüente com o cinema marginal, o que explica a dupla agenda do filme de Antonio Carlos da Fontoura: agradar ao grande público com as cores do policial e da comédia populares e, ao mesmo tempo, propor uma ficção antinaturalista que afrontasse as expectativas mais comuns.



Quando do surgimento de Madame Satã, de Karim Aïnouz, que retrata a mesma personagem por outras vias ficcionais, tudo o que se fez foi citar rapidamente A Rainha Diaba e falar das diferenças entre os dois filmes. Agora, com o DVD em mãos, fica mais fácil recuperar também as semelhanças entre dois projetos que se relacionam de maneira oblíqua com o status quo cinematográfico de cada época. Em ambos, pulsa um desejo de transgressão levado apenas às penúltimas conseqüências, dada a procura de relação com o público médio. Em ambos, há a pesquisa de uma visualidade ligada ao submundo carioca. Se Fontoura e sua equipe buscaram o pop – que dava as cartas por volta de 1973 –, Aïnouz trabalhou com uma fragmentação impressionista e uma densidade low-tech típicos da estética “de arte” agora em voga.



Os extras do DVD são ótimos para aprofundar o mergulho nas estratégias de produção e nas escolhas de linguagem de um período em que o cinema brasileiro tentava conciliar o maldito e o popular. Um documentário de 80 minutos cobre o trabalho do diretor, dos técnicos e do elenco, visivelmente bem instigados pelas perguntas (ocultas) de Rosângela Sodré. O crítico José Carlos Avellar comparece com uma análise iluminada de A Rainha Diaba, chamando atenção para o código puramente ficcional de um filme que, paradoxalmente, inspira-se em fatos reais. Merece destaque também o material filmado em Super 8 por Fontoura, que funciona como um precursor de making of em época anterior ao advento dessa forma regular de documentação.



Assalto ao Trem Pagador e A Rainha Diaba já receberam esse tratamento VIF (very important film) em discos que honram o cinema brasileiro e sua gente. Só resta torcer para que muitos outros títulos mereçam a mesma boa sorte.





# A RAINHA DIABA

Brasil, 1974

Direção e roteiro: ANTONIO CARLOS DA FONTOURA

Argumento: PLINIO MARCOS e ANTONIO CARLOS DA FONTOURA

Fotografia: JOSÉ MEDEIROS

Montagem: RAFAEL VALVERDE

Cenários e figurinos: ANGELO DE AQUINO

Música: GUILHERME VAZ

Produção: ROBERTO FARIAS

Elenco: MILTON GONÇALVES, ODETE LARA, STEPAN NERCESSIAN, NELSON XAVIER, YARA CORTES, HAROLDO DE OLIVEIRA, WILSON GREY, LUTHERO LUIZ

Duração: 99 minutos + extras

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