Durante o Festival de Cannes de 2003, a atriz e cineasta portuguesa Maria de Medeiros entrevistou dezenas de cineastas e críticos, entre eles os brasileiros Rubens Ewald Filho, Leon Cakoff e Luiz Carlos Merten. Músicas de Caetano Veloso, como You Don’t Know Me compõem a trilha sonora desta crônica de uma relação conturbada. No entanto, o tema, pra lá de polêmico, rendeu pouco mais do que uma troca de farpas e elogios de ambas as partes do que uma discussão profunda sobre o assunto. Em Bem Me Quer...Mal Me Quer (Je T’Aime... Moi Non Plus) há algumas revelações interessantes e depoimentos curiosos, mas sobretudo a repetição de alguns chavões já exaustivamente veiculados.
O cineasta finlandês Mika Kaurismaki, que mora no Brasil e tem fama de não aceitar críticas negativas a seus filmes, diz que todo crítico gostaria de ser cineasta. Muitos reclamam que os críticos sempre escrevem sobre o filme que gostariam de ter feito, ao invés de analisá-los propriamente. “O melhor crítico é aquele que mostra ao realizador o que ele mesmo não conseguiu enxergar em seu filme”, avalia o veteraníssimo diretor português Manoel de Oliveira, que lembra que uma critica a um de seus primeiros filmes, no inicio da década de 30, fez com que ele fosse compreendido como artista e salvou sua carreira.
O alemão Wim Wenders diz que é muito mais importante a opinião de alguém da platéia do que qualquer crítica, mas chamou atenção para as conseqüências nocivas de críticas cruéis e irresponsáveis. “Elas traumatizam os atores e conheço até quem já tenha cometido suicídio por causa de uma crítica ruim”.
Se os cineastas parecem implacáveis com os críticos e apenas interessados em ouvir elogios, os depoimentos de críticos colhidos por Maria de Medeiros só ajudam a alimentar a polêmica. Todd McCarthy, do Variety, por exemplo, diz que crítica é opinião, e por isso qualquer um pode escrever sobre cinema num jornal, não importando se é um colunista de esporte ou de culinária. Kenneth Turan, do Los Angeles Times, chega a admitir que é capaz de dormir durante boa parte de uma sessão e ainda assim escrever sobre o filme.
A cineasta, que obteve recepção negativa em Portugal para seu longa de estréia como diretora, Capitães de Abril, investiga outros aspectos da profissão de crítico. Jean-Michel Frodon, da revista Cahiers du Cinema, conta que evita conversar com os colegas apos a sessão para não se contaminar com a opinião alheia, enquanto o crítico britânico Alexander Walker diz que jamais sai do cinema antes do fim do filme, “da mesma forma que uma prostituta nunca recusa clientes”.
Este e outros depoimentos, como o de Rubens Ewald Filho contando como apanhou de um cineasta duas vezes num mesmo Festival, conferem graça ao documentário. Mas o filme de Maria de Medeiros peca por não ouvir o publico e tampouco os críticos mais jovens, que são maioria em muitas redações, especialmente no Brasil, e também não aprofunda a questão ética da relação entre crítico e criticado. Mas será que esse não seria o filme que nos gostaríamos que ela tivesse feito? Enfim, mais sensato é o cineasta canadense David Cronenberg, que diz que sua maior vingança contra os críticos é simplesmente ignorá-los.