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SE O POVO NÃO VAI AO CINEMA…

09.08.2005
Por Marcelo Janot
SE O POVO NÃO VAI AO CINEMA...

Enquanto se procura, numa discussão aparentemente sem fim, a melhor forma de fazer o cinema nacional voltar às telas na proporção que merece e reconquistar seu público, festivais se multiplicam pelo país afora, com o apoio de governos locais e empresas públicas e privadas. É a melhor forma de levar a produção brasileira para públicos que muitas vezes sequer foram ao cinema, e colocá-los em contato com formatos e linguagens diversas como o documentário, o curta-metragem, etc.



Aos poucos, esses pequenos festivais vão se estruturando e profissionalizando, obtendo assim também respeito artístico entre a classe cinematográfica, que muitas vezes ainda dá mais importância à oportunidade de fazer turismo de graça do que contatos profissionais, discussões, workshops, etc.



A questão da premiação é um capítulo à parte. Diretores consagrados evitam mandar seus filmes para competições de festivais de maior repercussão, como Gramado, porque acreditam que os prejuízos em caso de derrota são maiores que os benefícios em caso de vitória. Para muitos deles, sair de Gramado ou Brasília com uma batelada de prêmios em nada ajudará na carreira comercial do filme. Pode até ser verdade, dependendo do público que se quer atingir. Mas há vários outros fatores que levam ao fracasso comercial, como a irrisória verba de publicidade e o longuíssimo intervalo entre a exibição no festival e o lançamento nos cinemas. “Filhas do Vento”, de Joel Zito Araújo, um dos filmes mais premiados em Gramado ano passado, continua inédito quase um ano depois.



É nesse cenário que surgiu o Festival de Belém do Cinema Brasileiro, em sua segunda edição, dando uma aula de como conjugar todos os aspectos positivos que um festival de cinema pode oferecer. Ter feito parte do júri de longas-metragens me deu a oportunidade de conferir de perto como se pode realizar um trabalho sério e ao mesmo tempo ambicioso, dentro de suas limitações. Poucos são os cineastas que sabem da existência e da seriedade desse festival, por isso uma das diretoras do evento, Dira Paes, precisou usar de seu carisma e sensibilidade para ir atrás dos filmes para competir. Acabou montando uma seleção de altíssimo nível, como raramente se vê em outros festivais.



Em primeiro lugar, acabou com a distinção entre documentário e ficção, reunindo-os na mesma competição de longas-metragens. E também abriu mão do ineditismo, selecionando obras já premiadas em outros festivais, como Cabra Cega, de Toni Venturi, Quase Dois Irmãos, de Lucia Murat, Do Luto à Luta, de Evaldo Mocarzel, e Estamira, de Marcos Prado. Destes quatro títulos, qualquer que fosse o vencedor, o prêmio estaria em boas mãos. Estamira acabou levando a melhor.



Mas embora o trabalho do júri tivesse sido extremamente sério, sem a tendência de querer fazer média com os cineastas presentes bajulando-os com prêmios de consolação (Quanto Vale Ou É Por Quilo, de Sergio Bianchi, não ganhou nenhuma estatueta, motivando ataques de fúria do diretor), a premiação é o que menos importa diante da possibilidade de exibir o filme em ilhas do entorno de Belém e insituições sociais, totalizando 58 sessões ao ar livre e um público estimado em quase 150 mil espectadores.



Os cerca de 90 festivais que se espalham hoje pelo Brasil afora reúnem anualmente um público de 2 milhões e meio de espectadores. É claro que esses números não fazem parte dos balanços anuais de bilheteria, e por isso ainda se lamenta a pequena taxa de ocupação dos cinemas que cabe à produção nacional (cerca de 8 %). Mas é através de iniciativas como o Festival de Belém, de Tiradentes, de Recife, etc, que o Brasil vai redescobrindo os Brasis na tela grande.

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