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RUSH – NO LIMITE DA EMOÇÃO

De: RON HOWARD
Com: DANIEL BRÜHL, CHRIS HEMSWORTH, OLIVIA WILDE
19.09.2013
Por Gabriel Papaléo
Este filme fica na galeria dos melhores trabalhos da irregular carreira do diretor Ron Howard, além de provar que Peter Morgan é um dos grandes roteiristas da atualidade em Hollywood.

No mundo automobilístico, diversas rivalidades entre pilotos transformavam-se em conflitos mais densos do que simples relação de adversários. Hoje em dia é difícil imaginar a Fórmula 1 fora da mecanicidade e precisão, com corridas que raramente produzem embates entre os competidores; mas a história deixa claro: nas condições perigosas do passado, pilotos eram caçadores, homens se arriscando na pista, sempre em busca de uma emoção que, por vezes, se revelava fatal. Como Ayrton Senna e Alain Prost, René Arnoux e Gilles Villeneuve, Nelson Piquet e Nigel Mansell, Niki Lauda e James Hunt, transformando as corridas em campo de batalha que levava os fãs ao prazer catártico que o bom esporte sempre causa.

Rush, o novo filme de Ron Howard, aborda a rivalidade de Lauda e Hunt focando em sua dramaticidade com surpreendente esmero, equilibrando tanto o debate pessoal dos personagens quanto o duelo nas pistas, para, novamente, traçar um panorama dos conflitos que a personalidade de dois homens ideologicamente distintos pode provocar.

Logo no início, o filme introduz Hunt e Lauda através de narração em off atribuída a cada um deles. O que - geralmente - é um recurso preguiçoso por parte dos roteiristas acaba por se revelar o primeiro indício de que o roteiro de Peter Morgan está mais interessado no contraste entre os pilotos do que em meramente recriar um evento histórico. O austríaco Lauda, profissionalmente compenetrado, é o homem focado e racional. Já Hunt, homem de temperamento explosivo, é a emoção encarnada: seduzido por mulheres, vícios e carros, Hunt preza mais pelo risco de desafiar a morte toda vez que entra no carro do que pelas suas reações pessoais, o que rende a disparidade entre o casamento do inglês e o do austríaco, representada por cenas que Morgan aborda de maneira sutil - como o balé de Lauda e sua mulher na piscina ou o diálogo forte entre Hunt e sua esposa. É na sensibilidade de Morgan e do diretor ao construir uma relação de respeito e interesse entre os adversários que o filme se destaca com uma carpintaria dramática que remonta o estudo de personagens visto em sua parceria de 2008, Frost/Nixon.

Howard é preciso ao entender a proposta do roteiro e filma os pilotos e seus conflitos evitando uma abordagem clichê, tradicional, dos filmes de esporte. As corridas são filmadas com arrojo (repare como Howard é criativo ao demonstrar a genialidade técnica de Lauda, capturando seu número 1 logo após uma bela ultrapassagem), e os diálogos são registrados com a precisão do diretor de Frost/Nixon. Cauteloso não só com o imaginário dos homens como esportistas, mas com o que há de mais pessoal neles, destacando Daniel Bruhl e um ótimo e eficiente Chris Hemsworth nos papéis dos protagonistas. E a fotografia do sempre competente Anthony Dod Mantle evoca os anos 1970 com precisão notável, além de colocar o espectador no meio do embate entre os carros, provocando um ótimo clímax, capaz de causar tensão notável.

A formidável montagem de Daniel P. Hanley e Mike Hill consegue distribuir bem o tempo entre o que há de pessoal e o que há de esportivo em Rush. O drama dos personagens é sempre pontuado por uma edição mais cadenciada, mostrando tanto Lauda quanto Hunt em igual intensidade, acompanhando a opção do roteiro de ao não eleger apenas um dos personagens para ser plenamente desenvolvido. Nas cenas de ação, Hanley e Hill utilizam funcionais letreiros para agilizar as corridas da temporada, o que potencializa o efeito dramático do clímax, cuidadosamente composto ao enfocar as decisões dos dois pilotos.

Como Frost/Nixon retratava as figuras-título, Rush é o embate filmado entre os dois gênios totalmente diferentes de Lauda e Hunt, mas estranhamente complementares, um tema que parece cada vez mais despertar o interesse de Ron Howard. O filme fica na galeria dos melhores trabalhos da irregular carreira do diretor, junto ao próprio filme de 2008, além de provar que Peter Morgan é um dos grandes nomes do mercado cinematográfico no que diz respeito aos pensamentos e consequências que um duelo histórico pode despertar.



Gabriel Papaléo - Estudante de Cinema



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