Elaborado a partir do livro “L’Elimination”, de Christophe Bataille, o documentário “A imagem que falta” (L’image manquante, Camboja/França, 2013), de Rithy Pahn, é um quase-manifesto da impossibilidade de se realizar uma sociedade comunitária livre de antagonismos e diferenças sociais. Fundado na realidade não-toda de se dizer essa impossibilidade em palavras, de se representar em imagens, a questão central é a ideologia em seu intento de realizar o Bem convertido em um Mal. Ao constatar esta impossibilidade no Camboja, ele nos impõe a necessidade de uma reflexão sobre como entender politicamente a experiência que, em seu país, vitimou cerca de dois milhões de pessoas e forçou os sobreviventes a trabalharem em campos de trabalho.
Pahn mistura os registros documentais com fotos do genocídio praticado pelo Khmer Vermelho no regime de Pol Pot, que dizimou sua família, ao trauma, que afetou a subjetividade das vítimas e sua própria infância representada pela imagem esculpida dos bonecos de argila: uma imagem que falta na sua memória e necessária à vinculação do passado vivido ao presente de sua enunciação fílmica em primeira pessoa. Assim, voltar a tratar desse episódio recorrente em sua obra como um sobrevivente do massacre, para continuar a viver, é ascender à simbolização de seu processo fantasmático, à capacidade de se lembrar da sua identidade apagada, de ligar a pulsão de morte à vida com a qual se pode brincar, construir, fantasiar: um processo de investimento pessoal na lembrança associado à teoria psicanalítica do recalque de Freud, cujo retrato mostra na parede de um consultório de psicanalista.