Críticas


O QUE VOCÊ FARIA?

De: MARCELO PIÑEYRO
Com: EDUARDO NORIEGA, ERNESTO ALTERIO, ADRIANA OZORES
01.09.2006
Por Jaime Biaggio
AUSÊNCIAS QUE FAZEM A DIFERENÇA

Responde aí. Porque eu mesmo não sei direito o que faria no lugar de Marcelo Piñeyro. Não é que este seu filme, exibido no Festival do Rio 2005 como O Método (tradução exata do original) e lançado em circuito pouco menos de um ano depois, seja ruim. É só que, com a mesma naturalidade e a mesma cadência com que me ganhou depois de um certo tempo, me perdeu mais ali na frente. E é difícil explicar exatamente o porquê.



Até saberia dizer onde ele me perdeu: no momento em que detectei como falsos e forçados certos movimentos de seus personagens, pouco além da metade da projeção. Mas aí está o ponto: até ali, O Que Você Faria? não havia sido exatamente um daqueles filmes em que você embarca como se estivesse vendo a vida passar diante dos olhos, sem nem perceber as intervenções dos mestres de marionetes. Pelo contrário: a premissa já aponta para um filme em que o roteiro é team-leader (sete executivos graduados, candidatos a uma alta posição numa mega-empresa não nomeada e nem especificada, são postos em isolamento numa sala onde são levados a embarcar num jogo verbal e psicológico ao fim do qual só deverá restar um, o futuro ocupante do cargo – isso enquanto Madri, onde tudo se passa, vive um dia de protestos contra os efeitos da globalização). E, como o roteiro, a encenação também assume seu caráter intrusivo. Recorre bastante, desde o início, a estratagemas como a tela dividida, por exemplo.



E, a princípio, nada disso incomoda – e nem a sensação dos primeiros 20 ou 30 minutos de estar vendo um 12 Homens e Uma Sentença repaginado. Intrigante, tenso, bem engendrado, O que você faria? só ganha com as características de thriller que aplica à sua estrutura-matriz de fábula moral. A combinação é boa e resulta, de início, numa construção sólida em que o debate sobre ética é realçado pela tensão discreta à la Big Brother, com candidatos ao posto trabalhando isolados ou em conjunto pela eliminação de um oponente, e onde a óbvia diatribe contra um capitalismo pragmático e desumano é comunicada pela sensação de que todos ali estão só esperando o momento certo para meter a faca nas costas dos adversários. Cordialmente, claro. Não é nada pessoal, só uma atitude proativa, visando resultados...



O que você faria? é tudo isso e, de repente, não é mais. O ponto de virada está em dois desdobramentos simultâneos do seu embate maior, que se estabelecem na metade do filme, após a pausa para o almoço dos candidatos, com dois deles já eliminados: a triangulação sexual entre dois homens e uma mulher e a informação confidencial que surge num diálogo entre dois outros homens. São os tais momentos que soam falsos. Curioso é que, mais para a frente, se justificam perfeitamente. Mas, no que estão ocorrendo, se colocam entre o filme e o espectador (ou ao menos se colocaram no caso em questão aqui).



A partir deles, há uma ligeira mudança de tom no filme, que caminha um pouco mais para a farsa, para a encenação metafórica de sua “mensagem” (em dado momento, o embate entre os candidatos que restam passa a se dar num jogo de bola adolescente, misto de queimado e stop, pensa-rápido-e-passa-a-bola). Mas também não é que essa parte não tenha sua força ou não se encaixe na lógica interna do filme. Ou seja, o problema está localizado na virada propriamente dita.



Ou talvez não seja exatamente isso. Talvez o problema esteja um pouco antes, ainda na fase do embate verbal em que dois dos sete candidatos são eliminados. O ponto é que ali, como pode sempre ocorrer num Big Brother da vida – mas não num filme, cujo desfecho, afinal, é previamente determinado – são eliminados dois concorrentes fortes, atores carismáticos e personagens consistentes, de personalidades bem desenhadas e ações e reações lógicas. A saída deles faz diferença: os concorrentes restantes têm perfis mais unidimensionais e, mais importante, maleáveis, movediços, vagos. O que TAMBÉM faz sentido: o filme, afinal, irá jogar com eles mais tarde, revelar novas facetas deles, usá-los para passar boas rasteiras nas expectativas do público.



E talvez o problema, no fim das contas, esteja aí. O que você faria? é um filme em que o desenrolar é abertamente manipulado por texto e encenação o tempo todo, mas que, para isso se resguarda evitando a solidificação do perfil de alguns personagens – pois precisará deles “limpos” mais tarde. E quando só restam esses na tela, não tem jeito, um vazio se estabelece. É nessa hora que o filme me perdeu. E quando isso acontece, bem, lembre-se da experiência de assistir o Big Brother. Afinal, quando só restam uns concorrentes sem sal lá na casa do Projac, nada impede que as derradeiras maquinações deles em busca do prêmio de tantos-mil reais tornem a última semana do programa eletrizante. Mas de que adianta se você já tinha mesmo parado de assistir semanas atrás...?



# O QUE VOCÊ FARIA? (EL MÉTODO)

Argentina/Espanha/Itália, 2005

Direção: MARCELO PIÑEYRO

Roteiro: MATEO GIL & MARCELO PIÑEYRO, baseado em peça teatral de JORDI GALCERÁN

Produção: GERARDO HERRERO & FRANCISCO RAMOS

Música: FRÉDÉRIC BÉGIN & PHIL ELECTRIC

Fotografia: ALFREDO F. MAYO

Elenco: EDUARDO NORIEGA, ERNESTO ALTERIO, ADRIANA OZORES

Duração: 115 minutos

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