Este filme se encaixa numa tendência mais recente de filmes que não são produções pornográficas de baixa extração, embora apresentem cenas mais explícitas de órgãos e/ou relações sexuais. O recente Nove Cançõesjá embaralhou mais as coisas. Há um pouco mais de tempo, Patrice Chéreau, em Intimidade, misturou atores de tradição em palcos shakespeareanos com filmagens onde o sexo não teria sido apenas representado. Estes filmes teriam a intenção (ou, às vezes,álibi) de discutir a questão de sexo no ocidente nos dias de hoje: com ou sem amor, com maior ou menor envolvimento da dupla em questão, etc. Todos descendem, direta ou (mais) indiretamente de Império dos Sentidos e de Último tango em Paris. Mas a questão, agora, não é tão dramática ou trágica como no Último Tango nem psicopatológica como no Império dos Sentidos.
O que está em pauta são os relacionamentos contemporâneos onde - mais uma vez - as pesoas não sabem "o lugar certo onde colocar o desejo". E mais ainda temem o envolvimento afetivo. Neste filme, a personagem feminina (que há não tantas décadas atrás provavelmente seria taxada de "ninfomaníaca") diz, com todas as letras, que sabe fazer sexo mas não sabe amar, e que não sabe se relacionar quando está apaixonada. Ao mesmo tempo o filme exibe um ponto de vista feminino de que os homens teriam o "coração" no pênis. Outra personagem diz que gostaria de casar com seu noivo, mas gostaria que ele tivesse o coração que tem e o pênis do ex-namorado com quem permanece transando de vez em quando.
O tema sexo & amor é pertinente e a discussão é boa - talvez eterna, sem uma "conclusão" clara na base do "certo/errado". Mas ainda não foi com este filme que a polêmica recebeu um bom impulso. Há uma boa tentativa de não se deter num espaço fechado da intimodade sexual ao mostrar o mundo familiar dos personagens principais e problemas familiares: os pais dela em separação crepuscular e o pai dele, velhinho e decrépito, precisando dos cuidados físicos do filhão até para se banhar e fazer higiene, ainda que razoavelmente lúcido.
Pena que, um pouco como nos filmes hardcore, tudo fique repetitivo e arrastado, sem um maior dimensionamento além da fenomenologia retratada. Os atores e seus personagens não despertam uma identificação imediata - o que também poderia ser uma boa tentativa - já que Leila (Lauren Lee Smith) não deixa claro que adora fazer sexo acima de tudo, mas a partir de determinado momento - prefere (ou só consegue prazer) com David (Eric Balfour). Mas teme ficar "estável" com um parceiro só. Ele, ao mesmo tempo que exibe peitorais sarados com o qual os espectadores masculinos gostam de se identificar (mesmo que imaginariamente), faz o tipo mais feioso do que o velho Belmondo - com a vantagem que não serviria de modelo para nenhuma estátua de homenagem a Príapo - outra boa tentativa de desfazer os mitos de culto ao corpo e tamanho como documento que vêm grassando no imaginário masculino há séculos e contaminando os ideais das moças, todos perdidos entre a liberdade sexual, o culto ao corpo e a dificuldade e medo de amar.
O velho tema de que em volta dos genitais existem pessoas e suas subjetividades pode soar moralista, mas é inescapável. No peito dos desafinados também bate um coração.
# DEITE COMIGO (Lie With Me)
Canadá, 2005
Direção: CLEMENT VIRGO
Elenco: : LAUREN LEE SMITH, ERIC BALFOUR, POLLY SHANNON
Duração: 92 min.