Críticas


DOR E GLÓRIA

De: PEDRO ALMODÓVAR
Com: ANTONIO BANDERAS, ASIER ETXEANDIA, LEONARDO SBARAGLIA, PENELOPE CRUZ, JULIETA SERRANO.
13.06.2019
Por Luiz Fernando Gallego
Almodóvar lida com o tempo que passa e o envelhecimento que se consola com luminosas recordações da infância.

Por duas vezes a carreira de Almodóvar esbarrou em filmes nos quais o divertido exagero habitual - que parecia ser sua marca registrada - atingiu as raias do grotesco: em Kika (1993) e A Pele que habito (2011). Depois de Kika, ele se reciclou com obras mais afetivas, tais como Tudo sobre minha mãe (1999) ou Volver (2006), dentre outras. Mas de 2011 para cá seus filmes não têm mostrado a mesma riqueza criativa, seja quando tentou retomar a "porralouquice" dos primeiros filmes da década de 1980 com o péssimo Os Amantes Passageiros (2013), seja no apenas satisfatório Julieta (2016). Sua obra mais recente é este Dor e Glória que estreou em Cannes 2019, de onde saiu com uma espécie de prêmio de consolação para o ator Antonio Banderas. É o melhor resultado do cineasta nesta década, mas ainda poderá frustrar quem espera encontrar os “exageros” que fizeram sua fama e despertaram o gosto do público por suas ousadias.

Na verdade, trata-se de um filme sobre a idade, o tempo que passa e o envelhecimento mesmo – que se consola com recordações da infância. Na primeira meia hora o ritmo pausado custa a decolar um pouco mais, coerente com a fragilidade e achaques do personagem de Banderas, um cineasta em crise de criatividade e depressivo. O roteiro, construído de forma cuidadosa, sempre alterna o presente (quase sempre em interiores, um pouco mais sombrio) e o passado - que é visto, nas cenas de infância, com uma luminosidade encantadora; não fosse a fotografia assinada por José Luiz Alcaide (de várias colaborações com Almodóvar e do recente e subestimado Todos já sabem, de Asghar Farhadi).

Destacando a relação, obviamente autobiográfica, do personagem cineasta com a mãe (Penélope Cruz na juventude, e Julieta Serrano na velhice), o diretor também fala mais abertamente de sua orientação sexual, havendo um bonito e emocionante diálogo no reencontro, depois de décadas, entre o personagem de Banderas e o do argentino Leonardo Sbaraglia. E, principalmente, uma recordação de infância que surge como uma epifania da atração pelo corpo masculino.

Outro belo momento é um monólogo do ator Asier Etxeandia que faz o papel de... um ator que recita um texto do personagem de Banderas.

Falta “pegada” no todo do filme que, no mais, é digno, ainda que, certamente, uma obra menor de Almodóvar.

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário