Críticas


TIME

De: KIM KI-DUK
Com: SUNG HYUM-AH, HA JUNG-WOO, SUNG-MIN KIM
07.09.2007
Por Luiz Fernando Gallego
A IDENTIDADE DO AMOR

Em Time (e por que o título brasileiro não é “Tempo”?), Kim Ki-Duk coloca uma questão prosaica dentro de uma forte moldura dramática -que vai se revelar quase surrealista: o tempo reduz o interesse amoroso?



Há uma cena em que homens conversam num bar e um deles diz que sim, que com o passar do tempo ele se cansa das namoradas e quer sair com outras mulheres. Mas o drama é desencadeado a partir deste temor em uma mulher, Seh-hee, certa de que seu companheiro, Ji-woo, está deixando de amá-la. Ela parte para uma atitude radical: desaparece e se submete a uma cirurgia plástica na qual modifica intensamente os seus traços faciais, reaparecendo na vida de Ji-woo meses depois, tentando conquistá-lo. Mas sua suposta vitória em cativar o afeto dele trará novas questões: e se ele gostava mais da “outra”?



Diz-se que a Coréia é o país onde mais mulheres jovens se submetem a cirurgias plásticas estéticas e/ou cosméticas, números que certamente estimularam a imaginação do cineasta e roteirista para este filme.



Como Primavera, Verão, Outono, Inverno... e Primavera - seu filme mais conhecido no Brasil e estimado por um público mais amplo do que conquistou com suas outras realizações que foram aqui exibidas - Time pode ser visto como um filme “circular”, ainda que se possa considerar algo gratuito o desfecho que se quer ligar à abertura. Importam mais as recorrências das cenas no mesmo café, com evolução semelhante de demonstrações doentias de ciúmes, brigas e desentendimentos entre casais, reiterando as dificuldades nos relacionamentos homem-mulher e suas diferenças intrínsecas.



Da mesma forma, destaca-se o tratamento do enredo para a questão do privilégio dado às aparências na atual “cultura do narcisismo” com o corolário do culto ao corpo, sendo ainda trazidas à baila outras questões: o que se ama quando se ama? O rosto da pessoa amada? Esta é a “identidade” do amor? Ou outras características corporais? Detalhes? Partes? Um todo?



De certa forma, o filme remete ao clássico de Hitchcock, Vertigo (Um Corpo que Cai), onde James Stewart se apaixonava duas vezes pela mesma mulher, mulher que se apresentava como outra. A perversão necrofílica do personagem hitchcockiano, que tentava recriar na “nova” a “antiga” mulher que ele crê já morta, é substituída por desencontros de outra ordem em Time, com novas problematizações. Da mesma forma, o desenvolvimento aqui tem outra conotação diversa da de Seconds (Segundo Rosto), uma realização hoje esquecida de John Frankenheimer, que tratava das chances de rejuvenescimento e de uma nova identidade antes de morrer.



Tal como a “nova” See-hee é a mesma Seh-hee anterior (com uma letra apenas modificada no novo nome), pode-se até dizer que Time é o mesmo Vertigo e o mesmo Seconds - transformados e atualizados para o século XXI, discutindo a vertigem (do afeto) e a possibilidade de uma “segunda” vida na mesma vida.



Apesar de nem sempre corresponder a toda ambição que o tema comporta, com alguns pontos menos bem resolvidos, trata-se de uma realização instigante e indispensável, com grande impacto visual nas (igualmente recorrentes) cenas passadas em uma praia cheia de esculturas, uma delas usada no cartaz do filme, que já é impressionante em si mesmo.





# TIME (SHI GAN)

Coréia do Sul, 2006

Direção, roteiro e edição: KIM KI-DUK

Fotografia: JONG-MOO SUNG

Música: HYUNG-WOO NOH

Elenco: SUNG HYUM-AH, HA JUNG-WOO, SUNG-MIN KIM

Duração: 98 minutos

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