Diversos filmes da safra do Oscar de 2021 poderiam ser classificados como sendo de “autoajuda”, por conta de suas mensagens edificantes. Um rótulo que na literatura e nas artes em geral por vezes pode ser interpretado de maneira depreciativa, mas que não compromete as muitas qualidades de “O som do silêncio”.
O mérito do diretor novato Darius Marder está na maneira de contar uma história que nos fala da importância de aprendermos a conviver com uma limitação física (no caso, a perda repentina da audição) e as lições que tiramos disso até conseguirmos enxergar novamente beleza no mundo. O drama de Ruben (Riz Ahmed) é potencializado pelo fato de ele ser um baterista que vive da música, ou seja, a deficiência afeta também sua profissão. Some-se a isso a condição de ex-viciado em drogas, recuperado após longo período de tratamento. A trajetória ascendente na música formando um duo de metal com sua companheira (também ex-viciada) ajudou na criação de uma rotina saudável.
A desestabilização causada pela surdez de alguém com esse perfil seria prato cheio para um dramalhão na mão de outro diretor-roteirista. Mas impressiona como “O som do silêncio” escapa dos clichês e outras armadilhas. A estadia de Ruben em uma comunidade de surdos, por exemplo, tem uma atmosfera documental que não deixa brechas para o início de novos romances ou sentimentalismo barato. Reside aí a força do filme, que também explora de maneira exemplar as possibilidades técnicas do desenho sonoro, nos transportando para dentro da mente angustiada de um personagem tão bem defendido por Riz Ahmed.
* Publicado originalmente na edição online de O Globo de 23.4.21.