Críticas


RIVAIS

De: Luca Guadagnino
Com: Zendaya, Mike Faist, Josh O'Connor
01.05.2024
Por Amanda Luvizotto
Uma partida de tênis com três pessoas em quadra e o desejo que os move

Tesão: “estado ou qualidade do que está teso ou esticado; embate violento; ímpeto; aquilo que se manifesta com força ou vigor”. A definição do dicionário Michaelis deixa claro que tesão não é algo que se aplica somente ao ato sexual, mas um impulso motor vital. Isto posto, pode-se dizer que também é a linha que costura cada cena, diálogo e personagem presentes em Rivais, escrito por Justin Kuritzkes e dirigido por Luca Guadagnino.

O filme, em um primeiro momento, pode parecer um
coming of age que aborda o amadurecimento de seus três protagonistas: Tashi (Zendaya), Art (Mike Faist) e Patrick (Josh O'Connor), todos talentosos tenistas no início de suas carreiras. Entretanto, passados alguns minutos, é evidente que o foco não se atém apenas ao arco dos personagens individualmente, mas sobretudo ao relacionamento entre eles e, principalmente, ao seu triângulo amoroso. É importante destacar como a escolha de elenco foi acertada, pois, além de atuações competentes, com um dos melhores trabalhos de Josh O’Connor, a química entre os atores é patente, algo imprescindível dentro da trama proposta.

A montagem do filme é bastante eficaz em inserir o espectador na atmosfera apresentada, provocando a sensação de que o público está em quadra junto aos personagens. A combinação de diferentes movimentos de câmera e diversas perspectivas da quadra contribui de forma positiva para a história, sem que tais efeitos pareçam exagerados, desnecessários ou até um capricho do diretor. A sequência em que a câmera faz um movimento de 180°, invertendo a perspectiva e exibindo os atores filmados por baixo, em uma espécie de
contra-plongée que elimina a quadra como objeto de cena, é inesperada, bem executada e merece ser citada.

Abordando ainda aspectos técnicos da obra, a trilha musical, assinada pela dupla vencedora de dois Oscars Trent Reznor e Atticus Ross, opera como uma sinalização ao público de que a sequência em questão trata de uma disputa ou embate, ainda que a maior parte não esteja acontecendo em quadra. O ritmo eletrônico escolhido é estimulante e marcante na mesma medida, funcionando como mais uma ferramenta na imersão do espectador na dinâmica do filme, além de pontuar sabiamente quais relações ali presentes são de fato desafiadoras para os envolvidos, algo que é um ponto-chave na trama.

O talento de Guadagnino para imprimir erotismo e sensualidade em suas obras é perceptível. Para além da fotografia de seus filmes, que explora a iluminação e as tonalidades em tela, o diretor sempre procura instigar o desejo do espectador, mesmo que a história contada envolva canibalismo –
Até os ossos (2022) –, um coven de bruxaria disfarçado de escola de dança – Suspiria (2018) – ou uma discutível relação entre um adolescente e um homem mais velho, dada a diferença de idade e maturidade entre eles – Me chame pelo seu nome (2017). Em Rivais, o cineasta consegue transformar o tênis, esporte considerado enfadonho por muitos – por seu ritmo lento e suas longas partidas – em algo excitante ao “colocar em quadra” não apenas dois jogadores, mas também suas ambições, frustrações e sentimentos. A fala, dita por Tashi, “uma partida de tênis é um relacionamento” define de forma sucinta o paralelo desenvolvido ao longo dos 131 minutos de exibição do filme, cujos atos o diretor fez questão de dividir e sinalizar em sets, tal qual uma partida do esporte.

Um ponto que exemplifica a habilidade de Guadagnino citada acima é o fato de
Rivais ser uma obra tomada e guiada pelo tesão e pela tensão sexual existente entre os protagonistas, ainda que não haja uma cena de sexo explícito sequer. Com uma protagonista como Zendaya, competente atriz e belíssima, seria algo infelizmente esperado que o diretor explorasse cenas ou cortes exibindo o corpo da profissional de forma desnecessária para a narrativa, o já conhecido male gaze, e isto não acontece. Nas poucas cenas em que há presença de corpos nus em tela, todos são masculinos, e não há interação sexual entre eles. Essa escolha de Luca Guadagnino demonstra cuidado e respeito com a atriz e agrada positivamente o público feminino, que não vê sua imagem explorada em tela, uma postura madura e condizente com o momento cinematográfico atual, após o movimento Me Too. Também exalta sua destreza como cineasta ao não fazer uso de ferramentas datadas, e ainda assim apresentar uma obra extremamente sensual.

Rivais
é um filme que aborda o desejo, em que o tênis funciona como um meio para que a sua história seja contada. A atenção aos detalhes da produção, desde as escolhas técnicas e narrativas, e até mesmo o figurino – o colar usado por Tashi com o pingente de dois elos em ouro branco e amarelo (“gelo e fogo”) ou as roupas esportivas já gastas de Patrick –, constrói um somatório de acertos e oferece um ótimo resultado final: uma obra divertida, contemporânea e excitante sobre relacionamentos.  

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