Críticas


ERA DA INOCÊNCIA, A

De: DENYS ARCAND
Com: MARC LABRÈCHE, DIANE KRUGER, SYLVIE LÉONARD
29.02.2008
Por Carlos Alberto Mattos
A ERA DA IMPACIÊNCIA

Denys Arcand diz que encontrou inspiração para o personagem de A Era da Inocência quando estava entediado com a maratona de entrevistas e eventos promocionais de As Invasões Bárbaras. Pensou, então, num personagem que fosse o seu contrário e pudesse tomar o seu lugar, deixando que ele fugisse das obrigações e da mediocridade ao seu redor.



O diretor de O Declínio do Império Americano e Jesus de Montreal nunca aspirou ao título de “canadense otimista”. Pelo contrário, seus filmes destilam uma crítica impiedosa à homogeneização dos costumes, à banalização das relações sociais e a uma proverbial insipidez da vida no seu país. Em A Era da Inocência (título estapafúrdio para vender um filme que no original quer dizer o contrário, “A Idade das Trevas”), o alterego do diretor é Jean-Marc Leblanc (Marc Labrèche), um funcionário público contra quem o mundo parece conspirar: a mulher e os filhos são autistas sociais, a mãe agoniza num hospital, o trabalho é um poço de depressão, o resultado dos exames médicos são os piores possíveis e as notícias que chegam pelo rádio e a TV podem tornar o suicídio uma opção razoável.



Mas Jean-Marc escolhe o caminho da fantasia. Faz como o Guido do felliniano Oito e Meio, que, vítima da rotina insuportável, começava o filme fugindo de um engarrafamento pelos ares. Jean-Marc escapa para um mundo imaginário onde as mulheres não resistem aos seus atrativos e uma reunião tediosa pode ser dissolvida a golpes de sabre. O problema é que Arcand passa o filme inteiro repetindo a mesma piada, como se Fellini consumisse todo o seu Oito e Meio com as fugas de Guido do trânsito.



Mais que uma comédia, A Era da Inocência parece o desabafo de um diretor cuja paciência se esgotou. Ele dispara farpas contra a cretinice dos funcionários da cultura, a desumanidade das leis, os excessos da correção política e do feng shui, os ideais de ascensão do subúrbio e todo um complexo de inferioridade do Québec em relação ao Canadá anglófono e à matriz cultural parisiense. Esses alvos são enfileirados para que os devaneios de Jean-Marc os atinja, um por um, de maneira bastante previsível e, afinal, bem tola.



Há uma contradição curiosa, um travo doce-amargo na ligeireza geral do filme. É que Jean-Marc sempre entra em conflito com suas fantasias, sejam elas historicamente regressivas (Roma Antiga, Cruzadas, torneios medievais, eflúvios de O Senhor dos Anéis) ou perfeitamente modernas (namoro com uma top model, assédio por casal de lésbicas). O conflito às vezes assume a forma desgastada da metalinguagem, como na reflexão da musa loura sobre o seu destino de fantasia para homens medíocres. A insatisfação com as saídas que ele mesmo inventa leva Jean-Marc, finalmente, a atingir um estado de consciência supostamente superior, que tampouco prima pela originalidade.



Arcand quis fazer um humor menos intelectual do que nos seus filmes anteriores, mas o estilo muito limpo e a falta de traquejo com a caricatura jogaram contra suas melhores intenções. A Era da Inocência sugere uma visão simplesmente rabugenta do mundo, que pouco diverte e pouco instiga o pensamento.



A ERA DA INOCÊNCIA (L’ÂGE DES TÉNÈBRES)

Canadá, 2007

Direção e roteiro:
DENYS ARCAND

Fotografia: GUY DUFAUX

Montagem: ISABELLE DEDIEU

Música: PHILIPPE MILLER

Elenco: MARC LABRÈCHE, DIANE KRUGER, SYLVIE LÉONARD, CAROLINE NÉRON

Duração: 104 minutos

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