Críticas


ATO DE LIBERDADE, UM

De: EDWARD ZWICK
Com: DANIEL CRAIG, LIVE SCHREIBER, JAMIE BELL, ALEXA DAVALLOS
07.05.2009
Por Leonardo Luiz Ferreira
FRACASSO DE ENCENAÇÃO

Imagens de arquivo da Segunda Guerra Mundial surgem imponentes na tela com a aparição do ditador Adolf Hitler e o massacre perpetrado por ele aos judeus no Holocausto. Um câmera alemão registra tudo que acontece à sua frente: espancamentos, mortes e correria. O plano passa de sépia para colorido em uma pequena fusão entre documentário e ficção. Buscar a realidade dos fatos, não do registro, é a cruzada que se propõe de início em Um Ato de Liberdade, de Edward Zwick. O que parece mais importante, atualmente, nesses dramas de reconstituição histórica é frisar que o roteiro se baseia em uma história real, como se o espectador se relacionasse de uma maneira mais efetiva com a obra ao tomar conhecimento de que provém da realidade – mesmo que licenças poéticas sejam tomadas e nunca evidenciadas. Portanto, para esses cineastas e roteiristas a única forma do público sentir a dor e refletir a respeito do Holocausto, ou de qualquer outra guerra, é por intermédio de um documento fiel, ao menos de uma proximidade com a realidade, do período. A ficção fica em segundo plano, ainda que seja ela a essência das produções.



O cineasta Edward Zwick inicia de forma despretensiosa a sua carreira com produções televisivas e a comédia romântica Sobre Ontem à Noite... (1986), estrelada por Rob Lowe e Demi Moore. Mas já em seu filme seguinte, Tempo de Glória (1989), passa a apostar em narrativas com pretensões heróicas e épicas, que se transformaram mais em veículos para estrelas, entre eles Brad Pitt em Lendas da Paixão (1994), do que propriamente bons filmes. Zwick é aquele típico diretor que segue a cartilha dos estúdios e sucumbe aos produtores e aos astros. Mas acima de tudo não demonstra talento; algo que foi se agravando com o tempo em que passou a ter orçamentos maiores e nenhuma qualidade de encenação, o que se comprova mais uma vez com Um Ato de Liberdade, que de dimensões oscarizáveis acabou por receber uma solitária indicação para a trilha sonora de James Newton Howard e uma bilheteria bem abaixo da esperada.



No lamentável Operação Valquíria (2008), o diretor Bryan Singer encontrou uma forma para justificar o sumiço da língua de seu personagem principal, um militar alemão, na qual acontece a fusão do alemão para o inglês. Já em Um Ato de Liberdade, tendo em vista a sua proposta de realismo, é de se estranhar que os poloneses sejam obrigados a falar inglês com um sotaque do Leste Europeu. Isso quer dizer que o real apregoado já começa a se contaminar pela ficção. A constatação definitiva dessa medida é transmitida com a manutenção de outras línguas, como o russo, na história.



A liberdade criativa é posta em prática sem que haja uma notificação plausível para ela. Escolhas equivocadas à parte, é através de uma imagem significativa que se revela o fracasso da mise-en-cène de Zwick: um menino observa uma vala repleta de corpos nus de judeus mortos; a tomada é feita com o auxílio da grua para mostrar a extensão do estrago e para demarcá-la é utilizada uma trilha sonora melosa e que em nada condiz com aquilo que é visto na tela. É nesse desencontro entre imagem e som que vai caminhar a narrativa do filme, porém é necessário afirmar que Edward não tem nenhuma habilidade para construir o drama, independente das possíveis escolhas impostas pelo estúdio.



O recorte histórico proposto em Um Ato de Liberdade é o de sempre: os alemães são extremamente malvados e até irônicos, como na sequência em que um oficial bebe vodca e faz piadas sobre judeus; e todo o sofrimento e angústia impingida aos judeus, que já foi tão retratado em centenas de filmes. Entretanto, o diferencial proposto é que se narra a história dos irmãos Bielski, que formaram uma comuna de resistência e lutaram bravamente contra os nazistas. O filme é estruturado a partir do mote de vingança dos irmãos, motivados pelo assassinato dos pais, em que inúmeros personagens surgem em sequência, mas nenhum consegue estabelecer contornos reais, apenas esboços.



Toda a ação é ainda mais prejudicada devido a montagem, que é norteada por inúmeros cortes desnecessários. O exemplo maior é uma simples cena de diálogo entre os irmãos no qual o diretor vai do plano geral ao médio, e corta em seguida para um primeiro plano ou close-up. Esse movimento é feito inúmeras vezes em poucos segundos de projeção. Não há como se ater a uma história dramática sendo contada dessa forma. E o problema de Zwick com decupagem só se agrava quando se analisa as cenas de ação em que não demonstra o menor domínio daquilo que quer ilustrar; algo já visto em outras de suas produções, em especial, O Último Samurai (2003). Até se arrisca em uma montagem por oposição, imortalizada por Sergei Eisenstein, de O Encouraçado Potemkin (1925), em que contrapõe morte e vida ao intercalar os planos de um casamento com um ataque aos nazistas, com uma trilha sonora que parece sempre desvirtuar a atenção.



As proporções sempre permanecem épicas na superfície, bem como a tentativa de humanizar ao máximo os personagens, em que se tenta aumentar o feito dos heróis em inúmeras tomadas que exaltam seu esforço e sacrifício, a mais constrangedora entre todas acontece perto do desfecho no qual um dos irmãos ressurge das cinzas - como no pior filme de ação, à moda de Braddock (1984), estrelado pelo cultuado Chuck Norris-, para ser o salvador. Além disso, há um investimento fracassado no elemento poético ao filmar um casamento em que se ressalta a estética de uma chuva de neve ou a luz solar que invade a cabana do líder quando esse tem a sua amada nos braços. É nessas intervenções publicitárias, que são a marca registrada de Lendas da Paixão, que Zwick revela seu total despreparo para encenar.



# UM ATO DE LIBERDADE (Defiance)

EUA, 2008.

Direção: EDWARD ZWICK

Roteiro: CLAYTON FROHMAN e EDWARD ZWICK

Fotografia:EDUARDO SERRA

Montagem: STEVEN ROSENBLUM

Produção: EDWARD ZWICK e PIETER JAN BRUGGE

Elenco: DANIEL CRAIG, LIVE SCHREIBER, JAMIE BELL, ALEXA DAVALLOS, JODHI MAY e MARK MARGOLIS

Duração: 137 minutos

Site Oficial: http://www.defiancemovie.com/



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