Críticas


DEIXA ELA ENTRAR

De: TOMAS ALFREDSON
Com: Kåre Hedebrant, Lina Leandersson, Per Ragnar.
10.01.2010
Por Patricia Rebello
FUGINDO AOS CLICHÊS COMUNS DE VAMPIROS

Deixe Ela Entrar, no original, Låt den Rätte Komma In, do diretor Tomas Alfredson, conta a história do surgimento da amizade entre Oskar (Kåre Hedebrant), garoto de 12 anos que segue os dias sendo atormentado pelos colegas da escola, e cujo maior projeto de vida é conseguir se impor perante eles, e Eli (Lina Leandersson), uma misteriosa menina de beleza exótica, cujo projeto de vida é conseguir uma meia duzia de pescoços por semana para se manter viva (ou, melhor dizendo, para se manter morta) e um parceiro/cúmplice que a ajude na empreitada. Eli é uma vampira. Oskar e Eli são solitários. Oskar e Eli dividem um profundo sentimento de inadequação e de desconforto em relação ao mundo. Oskar é albino, medroso, e coleciona casos de assassinato publicados em jornais; Eli é observadora, e tem grandes olhos verdes, que a condição de imortal acostumou a perceber tudo à distância. É claro que foram feitos um para o outro. Mas não é (apenas) por conta desse encontro perfeito que Deixe Ela Entrar merece ser visto.



Em uma fria noite no começo dos anos 1980, em uma Suécia pra lá de conservadora, Eli e o pai chegam ao prédio de Oskar. É nas cercanias de um suburbio qualquer de Estocolmo que se desenvolve essa história, com brigas, assassinatos, provocações e mortes; e a sensível relação de afeto e amor que cresce entre os dois protagonistas. O roteiro do filme é impecável, fugindo aos clichês comuns de histórias de vampiro, e se concentrando no que existe de vampirizável nas relações entre mortais comuns. Oskar fica cada vez mais forte e corajoso à medida que se envolve com Eli; e é através de uma sedução velada, sob um comportamento ora arisco, ora tímido, que Eli atravessa os séculos buscando alguém que a deixe entrar, e aceite acompanhá-la. Vampiros não entram em ambientes a não ser que sejam convidados; no filme de Alfredson, eles também não entram nas vidas se não forem convidados. E é na forma como se articula a conquista deste convite que está a suavidade e a graça da história. Tanto um quanto o outro, são dois solitários que vivem no escuro, mas que sozinhos não conseguem dar conta do peso desse escuro, disfarçado nos finos flocos de neve que caem durante as noites. A ilusão do cinema a serviço das (des)ilusões da vida.



Tomas Alfredson reconhece que a fotografia do filme é extremamente sueca, seja no uso de uma paleta de cores pálidas, de uma luz opaca, e do formato scope na proporção 2.35:1, largo na medida certa para dar conta da imensidão, da sensação de vazio e abandono nas cenas panorâmicas, e das expressões e olhares do excelente trabalho dos atores nos planos mais fechados. O diretor conta que procurou muito até encontrar os atores certos para o filme, equilibrados e estáveis o suficiente para dar conta do turbilhão de emoções que envolve a relação entre Oskar e Eli. Impressiona a estoicidade e a contenção na interpretação dos jovens, que passam ao largo de referências melodramáticas e lugares-comuns. Hedebrant e Leandersson emprestam aos personagens aquilo que existe de mais bonito na infância, a inconsciência dos desejos operando sobre seus atos, e a inconsistência destes atos, na medida que é no processo, no entre-atos, que as crianças crescem e a vida acontece.



DEIXE ELA ENTRAR( Låt den Rätte Komma In)

Suécia, 2008

Direção: TOMAS ALFREDSON

Elenco: Kåre Hedebrant, Lina Leandersson, Per Ragnar.

Roteiro:JOHN AJVIDE LINDQVIST

Fotografia: HOYTE VAN HOYTEMA

Produção:CARL MOLINDER E JOHN NORDLING

Duração:114 minutos

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