Longe de mim defender Lasse Hallström, o diretor de dois xaropes cinematográficos intragáveis ( Chocolate , de 2000, e O Poder do Amor , de 1995), da crítica dos colegas, que o acusam de ter se transformado num “velho sentimentalóide”, amante de temas “familiares e piegas”. Apenas acho que Chegadas e Partidas merece um olhar mais cuidadoso, menos veloz. Com ele, Hallström volta aos temas que lhe são caros: a família; a infância massacrada; o ambiente gelado X o calor humano. Este filme é outra prova de que o diretor sueco conhece profundamente a família e os seres marginalizados por ela ou fora dela. Senão, vejamos: Quoyle (Kevin Spacey) é vítima de um pai boçal, o que o transforma num ser emocionalmente alienado. Depois de um relacionamento fracassado e com uma filha para criar, Quoyle embarca para a ilha onde viveram seus ancestrais: Newfoundland, no Canadá. E é neste pedaço de gelo disfarçado de cidade que ele descobre quem é e do que é capaz.
O enredo não é novo muitos quiseram sair do cinema ao perceber que se tratava de uma trajetória de redescoberta pessoal com toques esotéricos mas há detalhes que valem a visita. Baseado num romance de E. Annie Proulx vencedor do prêmio Pulitzer, a história tem um universo semelhante aos que Hallström retratou com Minha Vida de Cachorro e Gilbert Grape Aprendiz de Sonhador : são personagens inadaptados e talhados para o fracasso, tentando sobreviver num ambiente inóspito. E Cate Blanchett e Kevin Spacey dão um banho de interpretação com seus tipos subhumanos. Não há um olhar na atriz que não denuncie todas as intenções de Petal, a esposa oportunista e vagabunda. Spacey, ao contrário, conseguiu fazer de Quoyle um nulo. Ele não reage a nada, nem uma palavra que ele diga tem qualquer tom. Judi Dench como a tia de Quoyle e Rhys Ifans, como o amigo super boa praça, também se destacam. Parte deste elenco mais figuras como Julianne Moore e Scott Glenn tentam a vida num estranho cenário (que existe de verdade e foi pesquisado para o romance) onde o prato mais saboroso é torta de bigodes de foca.
Mas apesar de ter retornado aos elementos que domina, o diretor envelheceu e os personagens já não são tão ácidos e inusitados como os de Minha Vida de Cachorro e Gilbert Grape . Os diálogos do roteirista Robert Jacobs são os maiores responsáveis por isto. Eles resvalam na açucarada fórmula do amor e chocolate, formulando mensagens do tipo “você deve seguir seu destino” e “onde você nasceu é o seu lar”. Lasse Hallström tem que mudar de roteirista e produtores. Ou será que é ele que quer mais bilheteria e uma aposentadoria mais próspera? Talvez isto nem só a idade consiga explicar.
# CHEGADAS E PARTIDAS (THE SHIPPING NEWS)
EUA, 2001
Direção: Lasse Hallström
Roteiro: Robert Jacobs
Produção: Irwin Winkler, Linda Goldstein, Leslie Holleran
Fotografia: Oliver Stapleton
Música: Christopher Young
Elenco: Kevin Spacey, Julianne Moore, Judi Dench, Cate Blanchett, Pete Postlethwaith, Scott Glenn, Rhys Ifans, Gordon Pinsent, Jason Behr, Larry Pine.
Duração: 111 min.