A breve leitura da sinopse de A Promessa , filme baseado em romance de Friedrich Dürrenmatt, pode amedrontar espectadores mais exigentes. Afinal, não é a primeira e nem a segunda vez que algum diretor se dispõe a registrar a persistência de um detetive, em final de carreira, diante de um último caso, trabalho que não tinha a menor obrigação de aceitar, e sua briga com as instituições para levar adiante suas suposições certeiras. De fato, os clichês batem ponto neste filme de Sean Penn – na reedição, inclusive, de muitas cenas batidas, como as do detetive pegando o tal caso já na sua festa de despedida do trabalho e desistindo da viagem de férias no aeroporto para se dedicar a esta empreitada definitiva. Seqüências que podem tornar requentado o sabor da produção, ainda que não cheguem a comprometer a visita do espectador.
Quem se dispuser a quebrar esta capa de aparências poderá encontrar pontos de interesse. Há, por exemplo, uma carga fanática que atravessa o filme, um vigor messiânico nefasto que contamina, ainda que de formas e em graus diversos, os personagens “do mal” e “do bem”. O extremismo não aparece apenas no assassinato com requintes de crueldade de uma menininha de oito anos mas também no desenho dos pais dela que, ao receberem notícia tão arrasadora, não esquecem de determinadas regras (proibido fumar dentro de casa) e se agarram em crenças desesperadas (a promessa do título, comandada pela mãe mas que ganha a adesão e, por conseguinte, o comprometimento do detetive Jerry Black, interpretado por Jack Nicholson).
Não é só: mesmo que rapidamente, Sean Penn coloca personagens e espectadores diante do incômodo (a imagem do corpo ensanguentado da menininha e de um índio acusado do assassinato monologando palavras aparentemente sem nexo, característica, que, a partir de um determinado momento, passam a servir a um encastelado Jerry), daquilo que fere o olhar (Jerry aconselhando os pais a não verem a imagem brutal da menina porque “até nós mal ousamos olhar”). Ao contrário de seus colegas de profissão, Jerry Black enfrenta com sobriedade os extremos emocionais de pessoas estranhas sem, porém, deixar de se afetar pela dor alheia. Não está descolado do humano. Cataliza um vazio afetivo particular para o trabalho, algo que começa a ser sanado pela presença de uma mulher, cuja vida parece distante de qualquer idealização.
A estranha passividade de Jerry diante do desenrolar de um acontecimento eleito como ponto central de sua vida talvez possa ser creditada como falha de um roteiro que não evolui de modo a justificar a evolução(?) psíquica do protagonista. Mas, por outro lado, introduz ambiguidade num personagem que, apesar de dotado de plena capacidade de doação, se perde dentro de si mesmo. Ao final, Sean Penn não só fura como expõe a total falta de validade do esquema-padrão através de um Jerry completamente submetido a um julgamento coletivo (“maldito bufão”, dizem os que se encontram em volta) que está longe de figurar como verdadeiro.
# A PROMESSA (THE PLEDGE)
EUA, 2001
Direção: SEAN PENN
Roteiro: JERZY, MARY OLSON-KROMOLOWSKI
Fotografia: CHRIS MENGES
Trilha Sonora: HANS ZIMMER
Montagem: JAY CASSIDY
Produção: MICHAEL FITZGERALD, ELIE SAMAHA e SEAN PENN
Elenco: JACK NICHOLSON, ROBIN WRIGHT PENN, VANESSA REDGRAVE, HELEN MIRREN, BENICIO DEL TORO, AARON ECKART, SAM SHEPARD
Duração: 125 minutos