Críticas


DETONA RALPH

De: RICH MOORE
29.01.2013
Por Daniel Schenker
Sob risco de extinção

A necessidade de pertencimento norteia as atitudes dos personagens centrais deDetona Ralph ( Wreck-it Ralph , no original), animação que estreia amanhã nos cinemas. Protagonista da história, Ralph é o vilão do fliperama Conserta Félix Jr. Por sua condição de antagonista, sofre com o desprezo dos demais integrantes do jogo. Na tentativa de mudar a ordem previamente determinada, ele se infiltra em games diversos. O objetivo é conquistar a medalha de herói e, assim, se tornar querido e respeitado. Ralph acaba se deparando com Vanellope, a rejeitada menina do jogo Corrida Doce, que, tratada como falha do sistema, também deseja se sentir incluída, encontrar um (privilegiado) lugar no mundo.

Mas a angústia diante da solidão não se limita a Ralph e Vanellope. Todos temem a exclusão, o que pode acontecer se seus jogos forem desativados. Esta ameaça paira sobre o Conserta Felix Jr., que está completando 30 anos e periga ser considerado obsoleto, mesmo que apressadamente. O diretor Rich Moore propicia ao espectador não “só” um oportuno passeio pelo tempo como suscita uma reflexão acerca da eventual desqualificação do entretenimento simples em prol daquele que ostenta novidades tecnológicas.

Se esta abordagem se destina mais ao público adulto, não falta material voltado para as crianças. Além de funcionar como diversão, essa produção dos estúdios Disney chama atenção para a importância de cada um se aceitar como é. Cabe valorizar as próprias especificidades, ao invés de obedecer ao instituído. O filme, inclusive, bagunça com o pré-estabelecido. Basta dizer que o vilão Ralph bate na tela como o grande mocinho da história. Já os que demonstram boas intenções muitas vezes não estão sendo realmente sinceros. Os estereótipos, portanto, não têm espaço aqui. E o cineasta lembra que a figura do herói decorre mais de uma eleição individual, afetiva, do que de uma designação coletiva.

Tudo isso vem envolto em cenas impagáveis, a exemplo da passagem da reunião do grupo de apoio aos vilões, logo nos primeiros instantes de projeção. O contraste estético – entre as tonalidades escuras, sombrias, de um game e as cores vibrantes, luminosas, de outro – desponta como um atrativo à parte. As qualidades não param por aí. A dublagem é ótima: Tiago Abravanel e Rafael Cortez se destacam ao emprestarem suas vozes para, respectivamente, o injustiçado Ralph (em inglês, John C. Reilly) e o bem-comportado Félix Jr. Até os tipos circunstanciais (como os coadjuvantes do game Conserta Félix Jr.) são desenhados com precisão. O resultado seria ainda melhor com alguns minutos a menos. A ausência de concisão talvez se deva à ânsia em desenvolver as subtramas apresentadas e oferecer à plateia mirim uma variedade de gêneros (farta dose de comédia, um pouco de drama, um tanto de ação concentrada na corrida de carros ao final). Inegavelmente, a disputa entre Ralph e o verdadeiro vilão é excessiva. Nada, porém, que ameace o saldo satisfatório dessa obra caprichada e esperta.



Crítica publicada no jornal O Globo em 3/1/2013

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