Críticas


OS AMANTES PASSAGEIROS

De: PEDRO ALMODÓVAR
Com: JAVIER CÁMARA, CECILIA ROTH, LOLA DUEÑAS
28.06.2013
Por Marcelo Janot
Um interessante manifesto político por detrás da divertida capa “alienante”.

Há muito tempo que filmes vêm estampando o aviso “baseado em uma história real” nos créditos iniciais como se isso fosse garantia de qualidade, e não um sintoma da crise criativa dos roteiristas, especialmente em Hollywood. Como criatividade nunca foi um problema para Pedro Almodóvar, ele inicia “Os Amantes Passageiros” com o aviso de que tudo o que o espectador verá é pura ficção.

Nem tanto. Por detrás da aparência escrachada que remete ao estilo cômico exagerado de seus primeiros filmes encontram-se vários motivos pra se levar o filme bastante a sério – e nem precisamos falar que a fictícia companhia aérea espanhola do filme seria uma referencia à Iberia (um terror para quem precisa viajar para Europa por tarifas um pouco mais em conta), já que essa é uma das analogias menos explícitas.

O que vemos no vôo tresloucado de Almodóvar é uma duríssima crítica à Espanha atual. Sem necessidade de mencionar de maneira literal a crise em que o país se encontra, temos uma classe econômica que é dopada para suportar o vôo sem rumo de uma aeronave quebrada, condenada a rodar em círculos. Na classe executiva, uma série de tipos, de um banqueiro falido a uma veterana dominatrix habituada a prestar serviço a poderosos, ao lado de um galã de novelas mexicanas e uma pós-balzaca ansiosa por perder a virgindade, encontra-se um extrato interessante de uma suposta “elite”. E a hipocrisia é o que dá o tom na maioria das relações humanas, incluindo aí os comissários gays e os pilotos enrustidos.

O acerto de Almodóvar está no tom encontrado pra tratar de tudo isso. Longe da sofisticação formal do que se convencionou chamar de sua fase “madura” - os melodramas como “Fale com Ela” e “Tudo Sobre Minha Mãe” - ele volta sem medo e pudores aos diálogos de forte conteúdo sexual de seus primeiros filmes, sem qualquer preocupação no sentido de não soar exagerado ou de não resvalar no mau gosto. Assim, o espectador precisa estar preparado para ouvir diálogos tais como:

- Queria fazer uma chamada.

- Uma mamada?

Funciona? Lógico que sim. Há vários momentos engraçadíssimos, em parte graças ao talento de uma trupe almodovariana que inclui Cecilia Roth, Lola Dueñas e sobretudo Javier Cámara na pele do comissário chefe Joserra (que fica mais engraçado ainda quando volta e meia temos a impressão de ouvir “José Serra”). Sem a pretensão de fazer a comédia mais engraçada de todos os tempos, “Os Amantes Passageiros” ainda assim sofre com algumas turbulências. Nota-se por vezes um certo desleixo no desenrolar da trama, com o ritmo caindo vertiginosamente. Mas nada que apague a boa impressão deixada em quem conseguir enxergar um interessante manifesto político por detrás da divertida capa “alienante”. Lembrando que o filme começa com uma versão de “Für Elise” em ritmo de cumbia peruana psicodélica, passa por um momento musical gay ao som de “I’m so excited”, das Pointer Sisters, e termina com o rock indie inglês do Metronomy, “Os Amantes Passageiros” veio ao mundo para confundir mesmo, daí tantas opiniões conflitantes a seu respeito.

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário



Outros comentários
    472
  • Henrique Zalt
    29.06.2013 às 11:50

    Colocar a Penélope Cruz e o Antonio Banderas atuando um minuto cada um, e anuncia-los nos cartazes, já mostra a intenção do filme.. Apelativo. Sempre achei os filmes do Almodôvar, bons, muito bons e ótimos. Sempre os vi com boa vontade. Este porém é muito ruim mesmo. Chato, apelativo, grosseiro e com diálogos que além do mau gosto sempre soaram como apelativos. As cenas exageradas de sexo não soariam tão mal se fossem colocadas dentro de uma trama interessante.. Nenhum personagem interessante. N o final ficou só a grosseria, a chatice e a repetição. Mesmo com toda boa vontade fiquei decepcionado mesmo.
  • 611
  • wagner
    18.09.2013 às 20:25

    se o filme fosse de um diretor desconhecido e sem uma aura 'cult' e intelectual, ninguém provavelmente teria ouvido falar. É duro dizer isso citando Almodóvar, que fez coisas maravilhosas, mas que porcaria!!!!!!